Imposto sobre Herança: Como se Programar para Uma Sucessão sem Sustos

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Em 20 de dezembro de 2023, foi promulgada a Emenda Constitucional (EC) nº 132, marcando o primeiro passo legislativo rumo à Reforma Tributária. Esse documento introduziu mudanças estruturais no sistema fiscal brasileiro. O Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) não passou ileso pelas mudanças.

O ITCMD é a taxa cobrada na transferência de bens e direitos de uma pessoa falecida para seus herdeiros. Essa tarifa é um imposto estadual, e cada estado tem autonomia para definir suas próprias regras, incluindo alíquotas, faixas de isenção e procedimentos para cálculo e pagamento. Ou seja, não há uma legislação federal única para esse tributo — o que pode complicar o trabalho de quem deseja planejar uma sucessão patrimonial sem grandes sustos.

O que mudou?

A Emenda Constitucional (EC) nº 132/2023 tornou obrigatória a progressividade das alíquotas do ITCMD. Ou seja, ela exige que os Estados que ainda utilizam quotas fixas adequem suas legislações à nova norma constitucional, respeitando a alíquota máxima permitida pela Constituição de 8%.

Segundo Leonardo Briganti, sócio do escritório Briganti Advogados e especialista em Direito Tributário, locais como o Alagoas, Amapá e Mato Grosso do Sul preveem uma alíquota distinta para a doação (com a passagem da herança ainda em vida) e sucessão. “Alagoas definiu a alíquota de 2% para doação e 4% para o evento causa mortis”, explica. No estado de São Paulo a alíquota é fixa em 4% para os dois casos. Já em Goiás (2% a 8%) e Minas Gerais (3,2% a 5%), as alíquotas são progressivas, a depender do valor do patrimônio herdado ou doado.

Após a aprovação da EC 132/23, o estado de São Paulo deu início ao projeto de Lei Estadual nº 07/24 para reajustar a legislação com a previsão da alíquota progressiva. O projeto propõe uma quota inicial de 2%, chegando em 8%, de acordo com a escala patrimonial. Desde março de 2024, o projeto encontra-se em debate na Comissão de Finanças, Orçamento e Planejamento do Estado.

A EC 132/23 também modificou as regras para o recolhimento do imposto sobre herança em relação aos bens móveis. Briganti explica que antes da Emenda, o recolhimento do ITCMD sobre bens móveis variava conforme o estado onde o inventário era processado ou, no caso de doações, de acordo com o domicílio do doador. Com a nova regra, a competência foi unificada para o estado de domicílio do falecido ou do doador, eliminando a possibilidade de o herdeiro escolher onde o inventário será realizado.

Com a nova proposição, de acordo com Aldo Macri, diretor da GoNext, a quota deverá ser aplicada progressivamente, conforme as faixas de valores abaixo:

São Paulo:

Até R$ 353,6 mil: alíquota de 2%
De R$ 353,6 mil a R$ 3 milhões: alíquota de 4%
De R$ 3 milhões a R$ 9,9 milhões: alíquota de 6%
Acima de R$ 9,9 milhões: alíquota de 8%

Paraná:

Até R$ 142, 6 mil: alíquota de 2%
De R$ 141,7 mil até R$ 708,1 mil: alíquota de 4%
De R$ 708,2 mil e R$ 4,9 milhões: alíquota de 6%
Acima de R$ 4,9 milhões: alíquota de 8%

A modificação também mexe com os planos de previdência Vida gerador de benefício livre (VGBL) e Plano gerador de benefício livre (PGBL), até então isentos de ITCMD e utilizados em planejamentos de sucessão patrimonial.

Com a nova regra, as modalidades seriam tributadas e caberia à seguradora fazer o seu recolhimento. No entanto, segundo Macri, o texto prevê uma exceção: não pagariam ITCMD os recursos aportados nos VGBLs há mais de cinco anos. Já para os PGBLs, o texto aprovado na Câmara prevê a cobrança do ITCMD, independentemente do prazo de aplicação dos recursos no plano.

Alterações adicionais

Além das mudanças já introduzidas pela EC 132/23, em 2024, em atendimento à Emenda Constitucional, o Congresso Nacional deu início à elaboração dos projetos de Leis Complementares para adicionar alterações adicionais ao projeto. Segundo Briganti, essas regras seriam destinadas a regulamentar a nova sistemática tributária, entre elas o projeto de lei complementar nº 108/2024, ainda em tramitação, que pode trazer mais alterações no ITCMD.

Um desses ajustes é a flexibilização da exigência do ITCMD nos casos de doações e heranças provenientes do exterior até que a Lei Complementar organize o tema.

A Emenda Constitucional 132/23 manteve a exigência de uma Lei Complementar para regulamentar a cobrança do ITCMD. No entanto, criou uma regra transitória válida até que essa norma seja editada. “Essa norma se aplica apenas a fatos ocorridos após a publicação da Emenda, ou seja, a mortes ou doações a partir de 20 de dezembro de 2023. Para eventos anteriores, não há flexibilização na exigência do imposto”, afirma o sócio da Briganti Advogados.

Antes, as doações para instituições sem fins lucrativos não eram automaticamente isentas do ITCMD. Embora algumas unidades da federação já previssem isenções para entidades com relevância pública e social, não havia uma regra geral na Constituição que garantisse essa não incidência em todo o país.

Agora, de acordo com o especialista, com a Emenda 132/23, essa isenção foi prevista no texto constitucional, inciso VII no art 155. O projeto de lei complementar 108/24 busca regulamentar esse acordo, estabelecendo critérios mais claros para as instituições que poderão se beneficiar da isenção do ITCMD.

Como se organizar

Para uma transição patrimonial sem sustos, é preciso se organizar. Além de estudar a norma vigente para os impostos sobre herança, também é preciso ficar atento aos prazos — ou o atraso pode elevar o valor total pago ao governo.

Em casos de falecimento, deve-se abrir o inventário no prazo de até 60 dias da data do óbito. “Caso não seja respeitado tal limite, aplicam-se multas de 10% do valor do ITCMD, podendo a chegar em 20% se exceder em 180 dias de atraso”, afirma o diretor da GoNext.

Para o pagamento, a lei determina que o imposto seja pago em até 30 dias após a homologação do cálculo oficial. “Na maioria dos casos a multa parte de uma cobrança de juros que começa em 0,33% por dia de atraso até um limite de 20%”, esclarece Macri.

Estratégias para transferir receita

As mudanças no imposto sobre herança alteraram as práticas de planejamento sucessório. Segundo Sharon Halpern, sócia da Blackbird Investimentos, como algumas jurisdições aumentaram as alíquotas do ITCMD e reduziram isenções, a sucessão direta se tornou mais onerosa. “Os investidores têm buscado a antecipação da transmissão, uso de previdência e estruturas mais sofisticadas para mitigar a carga tributária”, afirma. Por isso, a especialista aconselha algumas formas mais “eficientes” de fazer a continuidade da receita do ponto de vista fiscal.

  • Doações em vida: a doação programada pode ser feita dentro do limite de isenção ou com alíquota de ITCMD vigente, evitando tributação elevada na sucessão;
  • Holdings familiares: transferir ativos para uma empresa pode reduzir custos de sucessão e permitir uma gestão mais eficiente da tributação de dividendos;
  • Fundos exclusivos ou previdência privada: esses veículos podem permitir diferimento de tributação e isenção de ITCMD, dependendo da estrutura. Até o momento, para os Fundos de previdência (VGBL/PGBL), a transferência de recursos desses produtos ocorre sem incidência de ITCMD e sem necessidade de inventário.
  • Planejamento internacional: para casos mais complexos, o uso de trustes e estruturas offshore pode ser uma alternativa para otimização fiscal;
  • Seguro de vida: essa modalidade autoriza designar beneficiários em vida e alterá-los a qualquer momento. O benefício pago aos herdeiros não entra no inventário e, por isso, não há incidência de ITCMD, permitindo liquidez imediata para cobrir custos da sucessão. Além disso, ele também é isento de imposto de renda (IR).

De acordo com a sócia da Blackbird Investimentos, o planejamento sucessório deve garantir que os herdeiros tenham liquidez para arcar com impostos sem a necessidade de vender bens. Essa estrutura pode incluir o planejamento de liquidez. “Evite uma herança concentrada em bens imóveis, que são menos líquidos e podem exigir venda forçada”, explica.

Outra alternativa é a estruturação de partilha entre os herdeiros. Para a planejadora financeira, especialista em investimentos e sócia da GT Capital, Bruna Pacheco, isso pode evitar a sobrecarga de imposto em um único sucessor. “O uso de testamentos bem planejados também podem garantir que os bens sejam distribuídos de forma eficiente, evitando disputas judiciais”, afirma.

Para herdeiros mais jovens, Pacheco recomenda doações mais planejadas e diversificadas, utilizando mecanismos como fundos de investimento e seguros de vida. Já para sucessores adultos que já possuem experiência financeira, a criação de uma holding patrimonial pode ser uma boa estratégia.

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