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Diante da pressão para manter a competitividade e os lucros, empresas vêm promovendo mudanças estratégicas, ao mesmo tempo em que enfrentam cortes orçamentários em diversas áreas. Embora a maioria das companhias priorize a transformação digital, é provável que os orçamentos de TI estejam entre os primeiros a serem reduzidos.
A Forbes conversou com dois executivos da empresa de consultoria em tecnologia corporativa Rimini Street — o CEO, Seth Ravin, e o CFO, Michael Perica — sobre como as organizações podem otimizar seus orçamentos de tecnologia sem comprometer os avanços tecnológicos.
Confira, a seguir, os destaques da entrevista com os executivos
Forbes: Pesquisas lançadas no início deste ano mostraram que as empresas planejam gastar mais com tecnologia — embora esses estudos tenham sido feitos antes de o cenário econômico ficar tão incerto. Na sua visão, as companhias vão mesmo cortar gastos no setor de TI?
Seth Ravin: Com certeza. Estou vendo cortes de 20% e 30%.
Michael Perica: As empresas estão avaliando diversos cenários e realocando seus orçamentos. Nenhum desses cenários contempla projetos de próxima geração que seriam positivos, mas cujo retorno sobre o investimento ainda está distante — especialmente em um contexto que exige novos investimentos estrangeiros para reestruturar a cadeia de suprimentos e tomar decisões significativas com alto custo inicial.
Temos expertise em todas as jurisdições em que atuamos, apoiando clientes na manutenção de sistemas existentes para operar diante de múltiplas possibilidades de adaptação da cadeia de suprimentos. Não se trata apenas de construir, mas de abastecer. E esse ponto costuma ser negligenciado: abastecer de forma diferente, com um sistema confiável. Adotar uma abordagem corporativa para implementar tecnologia de próxima geração sobre essa base sólida cria uma oportunidade real de investimento, permitindo aplicar recursos em nossa oferta sem deixar de atender demandas inesperadas de capital geradas pelas incertezas em torno das tarifas.
Em média, quanto uma empresa gasta com tecnologia de que não precisa, como programas obsoletos, atualizações desnecessárias e logins não utilizados?
Ravin: Ficaria surpreso se o desperdício não fosse de pelo menos 30% do orçamento de TI, ou até mais. Acreditamos que até nós mesmos poderíamos cortar 30%. Entre 30% e 50% poderiam ser otimizados nos próximos anos.
Como as empresas acumulam tantos contratos de TI que continuam pagando, mesmo sem precisar?
Ravin: A maioria desses gastos acontece porque existem vários grupos de TI diferentes. Como muitas dessas soluções são oferecidas como serviço hoje em dia, alguém de um departamento qualquer compra um novo software com o cartão de crédito. Isso nem passa pelo setor de TI. Os times de TI acabam tendo que correr atrás de compras que nem autorizaram. Eles têm uma dificuldade enorme para juntar tudo isso e entender do que se trata.
Nós mesmos passamos por esse exercício. Michael e sua equipe disseram: sabemos qual é o orçamento de TI, mas quanto estamos realmente gastando? Fomos de departamento em departamento e, sem surpresa, encontramos cerca de 30% a mais do que o previsto no orçamento. Temos um plano com nosso novo CIO, que está reestruturando o setor. Vamos identificar todos os serviços de TI dispersos, centralizar tudo e otimizar, exatamente o que fazemos com nossos clientes. Porque isso simplesmente acontece. As empresas, no geral, acumulam muitos custos sem perceber, e depois precisam passar por um processo para otimizar. Esses ciclos são saudáveis, porque todos acumulamos coisas desnecessárias.
Perica: Quando você assina um contrato de software, normalmente compra mais do que precisa e não usa tudo. Isso gera estouros de custos. Tenho mais capital imobilizado, mais depreciação, muito mais aplicações do que preciso — e depois ainda sou obrigado a passar por ciclos de atualização, se seguir o que o fornecedor manda. Isso, surpreendentemente, é fácil de identificar nas empresas. Nem é preciso cavar muito fundo.
Ravin: Toda empresa de software hoje está pedindo para seus clientes fazerem grandes migrações e atualizações. Se for a Salesforce, eles querem que você adote o Lightning e os agentes de IA. Se for a SAP, exigem atualização obrigatória para o S/4HANA, que pode custar milhões de dólares. A Microsoft quer que você instale o Windows 11 em 27 mil estações de trabalho. São centenas de aplicações, e simplesmente não há pessoas, tempo ou dinheiro suficientes para fazer tudo o que esses fornecedores querem.
A realidade é que, para a maioria das empresas, essas mudanças são apenas projetos operacionais. Elas realmente não mudam a trajetória da empresa. Se eu trocar meu sistema de folha de pagamento que já está funcionando meus funcionários vão ficar mais felizes só porque o depósito agora vem de outra empresa? Eles não se importam. Se o sistema funciona, é preciso e o dinheiro cai na conta no dia certo, eles estão felizes. Então, o que você ganha ao gastar milhões em um novo sistema de folha, se isso não melhora sua empresa de forma a torná-la mais competitiva ou a reduzir seus custos? Há muitos projetos como esse sendo exigidos do CIO e do CFO, a ponto de deixá-los atordoados.
Estamos no início da incorporação da IA aos negócios. Especialistas dizem que as empresas que souberem integrar a IA às suas estratégias de TI terão uma vantagem competitiva. E as que não fizerem isso, correm o risco de ficar para trás. Mas com os orçamentos em queda, como cortar custos sem deixar de investir em inovação?
Ravin: Só temos uma quantidade limitada de pessoas, tempo e dinheiro. São os únicos três ingredientes que temos para fazer esse “bolo”. Todos são limitados, e a maioria dos CIOs adoraria fazer todas as atualizações possíveis. É da natureza deles. Eles querem o software mais recente, o melhor de todos. Mas aí vem a realidade, e eles são forçados a tomar decisões. O ponto em que estamos agora é o seguinte: se você tentar seguir o cronograma de todos os seus fornecedores de software, não vai conseguir inovar, porque estará ocupado fazendo atualizações de coisas que nem precisa.
Este é o momento para a metodologia do “caminho inteligente” da Rimini Street, que é basicamente tomar decisões difíceis. É como dizer: “Adoraria trocar de carro a cada três anos, mas sabe de uma coisa? Esse carro ainda está bom por uns 15 anos. Talvez eu tenha que dirigi-lo por 10, e não vou trocar de carro agora porque quero investir em IA.”
Você precisa ter coragem para fazer escolhas. E, se eu pudesse resumir a lição, seria: você vai ter que tomar mais decisões difíceis em TI do que jamais tomou. Esse é o momento em que você precisa de CIOs e CFOs fortes. O CFO, por natureza, acha que todo mundo está tentando tirar vantagem. Ele pergunta: “Será que realmente precisamos gastar com isso?” É da função dele, está no DNA do cargo.
Perica: Ninguém me liga para dizer “olá”. Ligam para pedir mais dinheiro. Você disse que as empresas querem incorporar IA aos seus sistemas. Mas isso é o que os fornecedores dizem que você deve fazer. Esse é um dos maiores erros que se pode cometer. Nós defendemos a abordagem de usar IA em toda a empresa. Extraia os dados do sistema que já tem, coloque na camada de usuário ou na camada de dados e, depois, invista em IA por cima disso. Os fornecedores estão dizendo: “Aqui está nossa IA para essa plataforma, aqui está nossa IA para aquela outra.” São modelos diferentes, treinados de formas diferentes e dão respostas diferentes. Você acaba com alucinações no sistema.
A inovação é: reúna todos os seus dados em um só lugar, torne-os consistentes e só então aplique o modelo por cima à medida que ele evolui. Invista nisso. É muito mais econômico seguir essa abordagem. E você terá respostas melhores.
Para uma empresa que está começando essa jornada sozinha, como ela pode determinar o que vale a pena atualizar, o que deve manter e o que pode ser descartado?
Ravin: A primeira coisa a fazer é montar uma lista completa do portfólio. Você precisa entender tudo o que está rodando, porque o próximo passo é ver item por item para decidir o que pode ser mantido por mais tempo e o que deve ser trocado. Ajudamos as empresas com essa metodologia porque elas nem sempre entendem, por exemplo: se eu continuar usando o Windows 10 por mais tempo, isso vai afetar a conectividade com outras coisas? São questões que elas nem imaginavam, porque o fornecedor está pressionando para fazer atualizações obrigatórias.
Se você estiver olhando para o ERP, vai querer saber: como garantir que ele estará seguro pelos próximos 10 anos? Como garantir que funcionará com outros produtos nesse período? E como garantir que estará em conformidade com mudanças fiscais, legais e regulatórias? Se eu resolver todos esses pontos e conseguir suporte, então posso continuar usando esse sistema. Se você quer manter seu carro por mais 10 anos, é melhor ter certeza de que haverá peças disponíveis e mecânicos que saibam consertá-lo.
Na situação atual, quão importante é obter um retorno rápido sobre os investimentos em sistemas de tecnologia?
Ravin: Nosso método é cortar custos, reinvestir esse dinheiro, simplificar os sistemas e, depois, comprar a nova tecnologia [com as economias] — tudo isso sem gastar mais do que o orçamento atual.
Dependendo da empresa, pode haver algumas que queiram pular imediatamente para a transformação porque enxergam um benefício real. Um dos nossos clientes acabou de implementar automação de processos robóticos. Eles automatizaram uma tarefa e passaram de 130 pessoas fazendo um trabalho para 80. Quantos empresários, nesse mercado e ambiente atual, não gostariam de ver algo assim acontecer no seu negócio?
Algumas empresas vão querer correr, cortar custos rapidamente, simplificar os sistemas e, então, partir imediatamente para a transformação. Outras, mais sensíveis a custo — como os varejistas com margem de lucro de 1% — talvez demorem mais nessa fase de economia. Elas podem dizer: “Agora, precisamos cortar custos para continuar existindo. Vamos fazer os cortes e adiar um pouco a próxima fase da transformação.”
Acho que cada um vai avançar em ritmos diferentes, dependendo de onde enxergam o melhor retorno. Mas a prioridade é que sempre é necessário ter um retorno imediato — nem que seja apenas em economia de custos.
Perica: Já houve muito investimento, muitas promessas para o médio e longo prazo. Todos nós vimos análises de negócios que, geralmente, falham. A hora é agora, como Seth disse. As ações precisam levar a economias claras e imediatas, com ferramentas de automação e a necessidade de usar de forma correta e eficiente aquilo que já foi implementado. E mais: nunca houve um momento melhor para obter um ROI imediato — não só com os ativos existentes, mas também com o que já está em operação. Eles podem funcionar melhor. Confie na gente.
Ravin: Este pode não ser um bom momento para muita gente na força de trabalho. Tenho viajado o mundo e feito muitas reuniões com líderes de grandes empresas. Posso dizer que até mesmo governos, como os da Malásia e da Indonésia, reconhecem que a IA pode substituir pessoas em tarefas administrativas. Aqueles que mantêm as engrenagens girando, movimentam papéis, fazem aprovações — 40% dessas funções poderiam desaparecer com a tecnologia que já temos. É como uma nova revolução industrial.
Todos os governos estão preocupados com o que vão fazer com todas essas pessoas cujos empregos podem literalmente ser substituídos por um agente de IA. É uma grande questão social e econômica, e isso vai se tornar cada vez mais evidente. Há coisas incríveis que podemos fazer, mas o impacto será sobre as pessoas. É esse o grande panorama. É maravilhoso o que somos capazes de realizar, mas haverá um impacto sobre a sociedade, e isso acontecerá muito rápido.
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