Editorial: O truco da corrupção

Nos últimos dias, o Brasil assistiu estarrecido às revelações da existência de um esquema bilionário de fraudes contra os segurados do INSS. A investigação apontou que associações que oferecem serviços a aposentados estavam cadastrando pessoas sem autorização, com assinaturas falsas, para descontar mensalidades dos benefícios pagos. A Polícia Federal estima que o esquema possa ter desviado R$ 6,3 bilhões, entre 2019 e 2024.

A realidade, no entanto, é que esse valor deverá ser muito maior, com o avanço das apurações. Começou em R$ 3 bilhões, já passou para seis e não se sabe até onde irá. Para se ter uma ideia, somente nesta quarta-feira, 473,9 mil pessoas não reconheceram descontos e pediram ressarcimento dos valores indevidamente descontados.

Trata-se de um dos maiores esquemas de corrupção já descobertos no país, e que entristece a todos porque é especialmente perverso, ao mexer no bolso de aposentados, pessoas simples, que às vezes recebem um ou dois salários mínimos de aposentadoria.

O que chama a atenção é que o esquema foi feito com a anuência de servidores públicos, e até agora nenhum deles foi preso. As prisões que ocorreram foram de pessoas ligadas às associações que faziam os descontos ilegais. Os servidores públicos que facilitaram o desvio, no entanto, seguem impunes, inclusive pessoas do alto escalão do INSS.

A resposta das autoridades, do governo e da classe política deveria ter sido maior, em virtude da abrangência das fraudes. O governo falhou com o contribuinte na prevenção ao roubo e, ao que parece, falha também na investigação e punição dos responsáveis.

Além disso, para piorar a história, é difícil para os aposentados, em geral pessoas de idade avançada, obterem informações sobre os desvios. Tudo é feito por meio de aplicativos, soluções tecnológicas cujo conhecimento, muitas vezes, não está ao alcance dessas pessoas.

A outra opção, de ligar para o INSS, parece ter sido feita para não funcionar: há uma longa espera e dificuldade em esclarecer as dúvidas.

É curioso que este esquema venha à tona justamente na semana em que se completou 20 anos da descoberta de outro escândalo de corrupção nacional: o mensalão. Na época, estimou-se que o esquema desviou pouco mais de R$ 100 milhões dos cofres públicos, no que se acreditava ser o maior escândalo de corrupção da história.

O que parece que estamos nos acostumando com a corrupção. Estamos anestesiados, e os desvios não causam mais a mesma indignação, muito pela sensação de impunidade que reina no país.

Mas, não podemos esmorecer e nos acostumarmos com essas notícias. E mudar esse sentimento é uma tarefa que cabe, inicialmente, às autoridades responsáveis pela investigação. É preciso agir rápido, apurar as responsabilidades, apresentar as denúncias e obter as condenações dos responsáveis, além de exigir o ressarcimento dos valores desviados. Só assim é que a população poderá voltar a ter um pouco de fé na Justiça e no país.

 

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