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A recepção não podia ser mais onírica: assim que atravesso o portão do Parque Nacional do Iguaçu, uma nuvem de borboletas amarelas, laranja e azuis envolve o carro que anda em marcha lenta para não colocar em risco o trânsito de mamíferos, anfíbios, cobras e lagartos que perambulam à vontade pelos 185 mil hectares da reserva, o último grande naco de Mata Atlântica no sul do Brasil, colado à tríplice fronteira com a Argentina e o Paraguai. Os 10 quilômetros entre a entrada e a clássica fachada cor-de-rosa e branca do Hotel das Cataratas, do grupo Belmond, servem para equalizar o ritmo do viajante com a tranquilidade que a floresta exala.
E bastou o motorista abrir a porta do veículo para eu ser abraçado pelo ronco que remete a uma das sete maravilhas naturais do planeta e patrimônio da humanidade. As Cataratas do Iguaçu estão logo ali, furiosas, lindas, inesquecíveis: 275 quedas esparramadas por cinco quilômetros de um cânion majestoso, o ponto-final da viagem de 1.320 quilômetros do rio que nasce próximo a Curitiba, rasga o Paraná inteiro até morrer no rio homônimo ao estado. Tal ruído funciona como um mantra que eleva o hóspede do Belmond a uma dimensão exclusiva, já que não existe outro hotel dentro do parque – ainda mais assim, tão pertinho das cascatas.
Sem esconder o sorriso de quem finalmente está em um dos hotéis mais desejados do Brasil, detenho-me por alguns minutos antes de ingressar ao lobby e reparo em duas placas: à direita, a que traz a informação da inauguração do hotel – 4 de outubro (por essas coincidências da vida, a exata data da minha chegada) de 1958, pelo então presidente da República, Juscelino Kubitschek, uma obra do arquiteto mineiro Ângelo Alberto Murgel; à esquerda, as cinco estrelas douradas, posicionadas em círculo, do Forbes Travel Guide, com a frase “Verified as One of the Finest Properties in the World 2024” (é o sétimo ano consecutivo que este local recebe a distinção de melhor hotel da América do Sul pelo FTG).

A inconfundível cor de rosa da fachada do hotel
Nas mãos de Diva
Pronto. Uma vez dentro do Hotel das Cataratas, inicio uma sequência de quatro dias de atividades e refeições que evidenciam o julgamento pra lá de positivo feito pelos exigentes colegas norte-americanos – a busca pela excelência está em todos os detalhes. Antes do relato de tais vivências, no entanto, é preciso sublinhar o que chama a atenção de forma imediata: o perfil dos colaboradores deste Belmond. Há um orgulho e uma felicidade de fazer parte de tal time que mesmo um contato rápido e corriqueiro pode resultar em boas risadas.
O maître do Ipê (restaurante para café da manhã, almoço e jantar), Claudiano Fontes, de 42 anos (13 deles no hotel), cearense de Juazeiro do Norte, é ótimo exemplo. Ele não apenas destila informações curiosas sobre os coquetéis criados pelo chefe de bares, Nacir Zandoná (me identifiquei com a Caipirinha Três Fronteiras: limão-tahiti, limão-siciliano e tangerina), e as cachaças servidas (palmas para a Companheira Single Barrel, envelhecida por 21 anos em barril de carvalho francês), como, em pouco tempo, estamos trocando figurinhas sobre os nossos filhos, desafios da paternidade e piadas que envolvem o meu Corinthians, que, àquela altura do campeonato, flertava com o rebaixamento para a Série B.

De terno escuro, Juscelino Kubitschek (presidente do Brasil de 1956 a 1961); à esquerda dele, o general Alfredo Stroessner (ditador do Paraguai de 1954 a 1989), em outubro de 1958, na inauguração do Hotel das Cataratas
No salão de paredes de vidro e vistas para o jardim e para a piscina, o alto astral impera quando a entrada aterrissa – um muito bem servido atum braseado com creme de abacate e pico de gallo. E a alta expectativa das carnes da parrilla se confirma no prato principal, em um senhor corte de fraldinha alta, com chimichurri, acompanhado por cogumelos, tomatinhos e aspargos tão bem entrosados que parecem ter nascido juntos.
À tarde, para abrir os trabalhos de uma estadia de sonho, massagem relaxante no Cataratas Spa. Na hora de escolher a intensidade do tratamento, optei por deep – e confesso que tamanha profundidade resultou em breves gritos durante a manipulação, sobretudo em determinado ponto do antebraço direito e da escápula direita. O fato é que entrei um e saí outro após 50 minutos sob as mãos fortes da brasiliense Edivânia Sabino da Silva, 47 anos, a Diva.
Cataratas exclusivas
As narinas castigadas pelo tempo seco e pelas queimadas que assolaram o país vão ao delírio na Caminhada ao Nascer do Sol: lufadas de ar puro e refrescante embalam um passeio de cerca de duas horas pelas passarelas do Parque Nacional, antes que os portões sejam abertos ao público. A experiência é exclusiva aos hóspedes do Belmond.
Guia natural de Foz do Iguaçu, Francisco de Assis Natividade Luz, de 61 anos, traz explicações sobre fauna e flora da região e ensina que o primeiro europeu a se deparar com as cachoeiras e ficar de queixo caído foi o espanhol Álvar Núñez, que, em 31 de janeiro de 1542, teria exclamado “Santa Maria de Dios”, o primeiro batismo do local feito pelos conquistadores. Em tupi-guarani, o significado de Iguaçu é “água grande”.
Com um binóculo Leica Trinovid 8×42 HD em punho, fica ainda mais impressionante acompanhar o balé do andorinhão (revoada de andorinhas que escondem seus ninhos em plena parede da cascata); a paciência da garça equilibrada na rocha para fisgar um peixe; a descomunal queda de 90 metros de altura da Garganta do Diabo, sob a bandeira argentina que tremula brava ao fundo, envolta por um vapor de água que passa a se alaranjar conforme os raios de Sol despontam, pintando com intensidade o verde-brilhante da floresta tropical.
Quando você acha que não existem elementos para deixar o cenário ainda mais exuberante, pipocam arco-íris aqui e ali como em um show de ilusionismo. De repente, você está chorando de felicidade e ainda nem tomou o café da manhã.

Piquenique com vista para as quedas, no gramado em frente à fachada da propriedade do grupo Belmond desde 2007
Se as lembranças da alvorada são inesquecíveis, as programações especiais desenhadas por Belmond para o pôr do sol não deixam por menos: piquenique no gramado em frente à fachada, debruçado sobre a vista das cataratas (destaque para o salmão defumado e o clericot); e coquetel privativo na torre – seleção de canapés com champanhe (destaque para o bolinho de costela e o ceviche de camarão) na torre adornada com motivos florais do pintor carioca João Incerti, enquanto a gema some no horizonte, logo atrás das quedas. Outro show.
E, atenção: não são atividades excludentes – vale desfrutar de ambas. Não abra mão também do espetáculo de música ao vivo e dança batizado de “Uma noite na fronteira”, realizado no jardim interno – um repertório emocionante que enaltece canções do Brasil, da Argentina e do Paraguai sob uma delicada (e linda) interpretação da cantora Marina Araldi, de 29 anos, paranaense de Coronel Vivida, enquanto são servidas cinco etapas de finger food e vinhos mesclando referências gastronômicas dos três países.
Piscina, quadra de tênis, xadrez e Y
Em um típico sábado de sol, o coração do Hotel das Cataratas bate forte na piscina de 310 metros quadrados e nas mesas do terraço do restaurante Ipê, muito procurado aos sábados por causa de uma feijoada “levinha”, que faz você comer sem parar e achar que não está comendo nada. Nas picapes do dia 5 de outubro, o DJ Fernando Santana enfileira clássicos da música popular brasileira, e o que se vê nas mesas é uma espécie de karaokê com os hóspedes acompanhando sucessos do cancioneiro nacional.

A piscina funciona como o coração do hotel_ água climatizada, um serviço impecável e trânsito de tucanos
Caminhos arborizados nos jardins conectam quadra de tênis, tabuleiro de xadrez gigante, kids club, spa e fitness center com os três conjuntos de prédios de dois andares que reúnem 176 acomodações (destas, 13 têm vista parcial das cachoeiras; a maior delas é a Suíte Cataratas, com 83 metros quadrados e que se conecta a outros dois apartamentos).
Belmond assumiu o Hotel das Cataratas em 2007, investindo R$ 60 milhões em uma ampla renovação das dependências e das áreas comuns assinada pelo arquiteto francês Michel Jouannet. Na ocasião, o grupo também financiou reformas do Parque Nacional (o segundo mais antigo do Brasil, inaugurado em 1939, dois anos depois do de Itatiaia), como o aterramento dos cabos de energia elétrica.
Entre as dependências internas, três ambientes – cada um por um motivo especial – são tão confortáveis e aconchegantes que convidam a esquecer do relógio para o desfrute ideal: a sala da lareira (com livros e tabuleiros para dama e xadrez); o bar Tarobá (iluminação baixa, mesas externas com vista para o poente, uma série artística perto do teto de gaiolas quebradas com pássaros pintados, além de um piano, base de uma irretocável apresentação da cantora Rubia Divino e da pianista Julia Klüber, interpretando Milton Nascimento) e o Y (se diz “i”) – para ele, no entanto, é necessário um parêntese mais comprido, ou melhor, um novo parágrafo (talvez dois).

Detalhe do salão de paredes de vidro do restaurante Ipê
Trata-se de um restaurante de cozinha brasileira criativa inaugurado em março de 2024 sob a batuta do badalado chef paulistano Luiz Filipe Souza, duas estrelas Michelin, responsável pelo sucesso do Evvai, em São Paulo. A degustação de 10 etapas harmonizada com vinhos brasileiros começa em uma antessala do salão principal. Ali, são servidas três “Comidinhas de Bar”: cupuaçu, patê de galinha montado e brioche; pastel de palmito-juçara e molho lambão; e chipa de queijo meia-cura, papada de porco caruncho defumada e pimenta-murupi. Esse trio de delícias serve para o comensal entender que está começando um jantar bastante peculiar – no meu caso, um dos melhores da vida (sem exageros, prometo).
E digo isso não apenas pelo viés do paladar: não satisfeito em criar o menu, Luiz Filipe assina a trilha sonora (toda brasileira – de novo, rolou o karaokê nas mesas) e os desenhos feitos em cartões que abrem cada nova etapa do jantar, sempre com explicações precisas do garçom Gilmar. Para não me alongar na surpresa da apresentação, das texturas e dos sabores de cada prato de um jantar fantástico de cerca de três horas, vou me ater a apontar dois favoritos: Pirarucu, “Açaí-Misso” e Pipoca de Tapioca (segunda entrada) e Carabineiro na Brasa e Moqueca Capixaba (primeiro principal). Não é fácil se tornar destaque em uma jornada a uma maravilha do mundo. Mas, sim, sem sombra de dúvidas, a degustação de 10 etapas do Y mal termina e você já tem certeza de que viveu um dos momentos mais saudosos da viagem.

Restaurante Y, que serve comida brasileira do chef Luiz Filipe Souza, duas estrelas Michelin
Em abril deste ano, o restaurante ainda inaugurou um novo espaço: o terraço Y, na varanda do hotel, com vista única para
as Cataratas. A novidade menus exclusivos de bebidas (atenção especial às borbulhas) e de comidinhas (mais na pegada de snacks e aperitivos), com serviço das 16h às 19h, para ver a atmosfera do entardecer em Iguaçu de camarote. Se o tempo e a disponibilidade de mesas permitir, estenda a experiência na parte interna com a degustação.

Vista única das quedas d’água do recém-inaugurado Terraço Y
Bem mais curto, mas bastante impactante, e na lista dos principais destaques em Foz do Iguaçu, está o voo panorâmico de helicóptero de cerca de 10 minutos – a melhor maneira de dimensionar o tamanho das cataratas rasgando o tapete verde de Mata Atlântica preservada. O que também salta aos olhos é o quão privilegiada é a localização do Hotel das Cataratas em meio à natureza exuberante. No heliponto, fica exposto o Boeing 737-200 utilizado por oito presidentes brasileiros, de 1976 a 2010, além de transportar o papa João Paulo II, em 1980.
Logo em frente ao local de partida do voo, uma atração que agrada adultos e crianças: o Parque das Aves, projeto de conservação de 30 anos, de reconhecimento internacional, que abriga mais de 1.300 pássaros de cerca de 140 espécies em 16 hectares de mata nativa, indivíduos salvos do mercado ilegal de animais, mas que não conseguem voltar ao seu habitat natural ou correm risco de extinção.

Suíte com vista para as cataratas
De volta ao hotel, a passarada segue presente, em voos de tucanos e nos cantos de diferentes melodias espelhados pelos jardins impecáveis. Quatro dias se passam em um estalo e a hora de ir ao aeroporto (a 15 quilômetros) chega mais rápido que o esperado. Dá tempo ainda de pedalar a bicicleta cor-de-rosa até a Trilha das Bananeiras e depois esticar até as passarelas e o elevador panorâmico da Garganta do Diabo. Não resisto a subir de novo até o topo da torre do Belmond Hotel das Cataratas para uma espiada derradeira nas quedas – e ali encontro dois saíras-sete-cores, passarinhos multicoloridos que não se espantam com a minha chegada e seguem curtindo o visual, paradinhos. No silêncio da cena, prevalece o mantra das cataratas e seu poder hipnótico.
Matéria publicada na edição 124 da revista, disponível nos aplicativos na App Store e na Play Store e também no site da Forbes.
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