Em seu artigo, Rodrigo Dias Nunes destaca a importância da ética no cuidado médico, especialmente em contextos de vulnerabilidade social.

A ética é a base do cuidado médico. Em contextos de vulnerabilidade social, ela ganha um peso ainda maior: orienta não apenas o que fazemos, mas como fazemos. O atendimento médico, quando exercido com respeito, equidade e sensibilidade, pode ser um instrumento de promoção de dignidade e cidadania, evitando que a Medicina reproduza ou aprofunde desigualdades.
O atendimento a essas populações vulneráveis exige uma escuta atenta e desprovida de julgamentos. Muitas vezes, os pacientes carregam histórias de dor, violência e desamparo. Uma postura ética implica reconhecer essas trajetórias, acolher sem preconceito e entender que o contexto de vida impacta diretamente na saúde. Mais do que ouvir sintomas, é necessário ouvir pessoas.
Os princípios clássicos da ética médica como respeito à autonomia, beneficência, não maleficência e justiça, são indispensáveis. Mas é preciso acrescentar a humildade cultural, reconhecendo saberes locais, e a compaixão ativa, que nos move diante do sofrimento.
As Missões Humanitárias da Inspirali têm sido fundamentais para contribuir com a visão ética dos nossos estudantes de medicina. Até 2025, quase 600 alunos, mais de 100 professores e 17 egressos das escolas de Medicina da Inspirali, incluindo a UniSul, participaram das dez edições da Missão Amazônia, Missão África, Missão Sertões e Missão Jequitinhonha, atendendo pessoas que, muitas vezes, nunca tinham tido acesso a um médico.
Neste ano, tivemos, ainda, a 2ª edição da Missão Jequitinhonha, que levou saúde a regiões isoladas. Também estivemos presentes em 2024 na Missão Rio Grande do Sul, atendendo mais de 8000 vítimas da enchente que devastou o estado vizinho. Atravessamos o oceano Atlântico para a 2ª Missão África, atendendo mais de 5000 indivíduos desprovidos de qualquer assistência à saúde. Nessas vivências, os estudantes aprendem a respeitar diferentes culturas, a desenvolver empatia real e a lidar com situações com responsabilidade e humanidade.
Ao sair dos hospitais e consultórios tradicionais e mergulhar em realidades desafiadoras, o estudante aprende, na prática, que ética não é apenas teoria, mas uma atitude diária. Aprende que o cuidado é um direito de todos, independentemente de onde vivem, como falam ou o que possuem.
O voluntariado ensina algo que não se aprende nos livros: o valor do outro. Ele coloca o estudante frente a frente com as desigualdades, convidando-o a desenvolver empatia, responsabilidade social e senso de justiça. Ao se comprometer com causas humanitárias, o futuro médico constrói uma ética do cuidado verdadeiramente enraizada na realidade.
Aprendi com as missões e o voluntariado que o silêncio pode ser tão terapêutico quanto a palavra, e que o tempo do outro é diferente do nosso. Que não existe hierarquia entre quem cuida e quem é cuidado e, sim, existe uma troca. E que, diante da dor humana, o compromisso ético maior é ser presença, ser ponte, ser instrumento de esperança.
Rodrigo Dias Nunes é Médico, Professor e Diretor de Extensão Curricular, Extra-curricular e Travessia Humanitária da Inspirali.