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O uso da inseminação artificial em tempo fixo (IATF) na pecuária, em comparação com o modelo tradicional de monta natural dos touros, resultou em ganhos expressivos de produtividade e redução significativa na emissão de gases de efeito estufa (GEE) no Brasil. A conclusão é de um estudo liderado pela Fundação Medicina Veterinária (FUMVET), ligada à Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo (FMVZ/USP), em parceria com a GlobalGen Saúde Animal, empresa brasileira de biotecnologia veterinária.
O estudo mostra que a IATF reduziu em até 49% a pegada de carbono na produção de carne bovina e em 37% na de leite, ao mesmo tempo em que ampliou significativamente a produtividade. “Com a adoção de tecnologia para melhorar a eficiência reprodutiva e genética do rebanho brasileiro – a IATF é uma biotecnologia–, é possível produzir mais carne e leite reduzindo a pegada de carbono por quilo de alimento produzido. Como o rebanho brasileiro é o maior mundialmente, com a adoção da IATF, os impactos são consideráveis”, diz o doutor Pietro Sampaio Baruselli, professor titular da FMVZ-USP, um dos maiores especialistas do mundo em biotecnologias reprodutivas aplicadas à bovinocultura, especialmente em IATF e fertilização in vitro. Baruselli tem participação ativa em pesquisas de referência, colabora com instituições internacionais e atua fortemente em projetos que conectam ciência acadêmica à prática no campo.
“A IATF se adequa perfeitamente aos sistemas de manejo, como a Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF) ou uso de aditivos nutricionais com elevada sinergia”, afirma Baruselli. Fazem parte do grupo de pesquisa Laís Ângelo de Abreu, doutorando sob orientação de Baruselli, e Vanessa Romário de Paula, da Embrapa Gado de Leite, em Juiz de Fora (MG), que atua nas áreas de gestão ambiental, sustentabilidade, licenciamento ambiental e avaliação de ciclo de vida na pecuária de leite.
As Vacas e a Avaliação do Ciclo de Vida (ACV)
Foram modelados dois cenários distintos: o primeiro com monta natural e o segundo com uso de IATF. Em ambos, se considerou um ano zootécnico completo. A base incluiu dados primários da GlobalGen, bancos como Ecoinvent e referências técnicas da Embrapa. A metodologia seguiu as diretrizes da Avaliação do Ciclo de Vida (ACV), conforme as normas ISO 14040/44/67 e o IPCC (2019).

Pietro Sampaio Baruselli, professor titular da FMVZ-USP
“A metodologia escolhida garante rastreabilidade, transparência e comparabilidade dos resultados em nível internacional, o que é essencial, inclusive, para o mercado de carbono emergente”, diz Vanessa.
No caso do estudo, a análise considerou o modelo “cradle to farm gate” — ou seja, avaliou todas as emissões geradas desde a produção dos insumos até o momento em que o leite e a carne saem da fazenda, sem incluir transporte ou processamento industrial. Além disso, a metodologia converteu todas as emissões em quilogramas de dióxido de carbono equivalente (kg CO2eq) para padronizar a comparação de diferentes gases (metano, óxido nitroso e CO₂).
No sistema de leite, 595 mil vacas em lactação foram inseminadas com IATF. A produção subiu 36% e a pegada de carbono caiu de 1,44 para 1,06 kg CO2eq por quilo de leite corrigido (FPCM). O ganho foi atribuído à redução da idade ao primeiro parto, do intervalo entre partos e aos ganhos genéticos associados à inseminação.
No sistema de corte, 4 milhões de vacas foram sincronizadas com IATF. A produção aumentou 27% e a pegada de carbono caiu de 41,46 para 27,91 kg CO2eq/kg peso vivo. Houve redução da idade ao primeiro parto (de 48 para 24 meses), aumento da taxa de desmame (de 60% para 80%) e ganho de peso nos bezerros.
“A metodologia garante que nossos resultados são comparáveis com estudos da Europa ou América do Norte. Essa padronização é essencial para a inserção da pecuária brasileira em cadeias globais que exigem rastreabilidade e mensuração de impacto”, afirma Vanessa. “Estamos pavimentando o caminho para a inclusão da pecuária em modelos de crédito de carbono baseados em eficiência produtiva. O carbono que deixamos de emitir ao sermos mais eficientes deve entrar na conta.”
No que Baruselli reforça: “A comparação entre monta natural e IATF mostra claramente que, ao aumentarmos a eficiência reprodutiva, reduzimos a pegada de carbono por quilo de produto gerado. É uma relação direta entre eficiência zootécnica e sustentabilidade”.
Para Laís Abreu, ao analisar os rebanhos de vacas, “a eficiência reprodutiva é o centro das emissões. Ao antecipar partos, reduzir dias em lactação ou aumentar taxa de prenhez, você reduz recursos por unidade de carne ou leite. Isso se traduz em menos carbono”. Para ela, com informações técnico-científicas e a regulamentação do mercado de carbono, será possível criar modelos de certificações sustentáveis, traduzidos em ganhos diretos ao produtor rural. “Os resultados do presente estudo trouxeram importantes informações que colaboram para quantificar as emissões dos sistemas de produção pecuários, que podem se transformar em uma iniciativa ou uma tecnologia em uma ação real em prol da redução.”
Por que é preciso menos vacas e mais bezerros no pasto?
Há vários estudos mostrando que na pecuária de corte, por exemplo, a unidade vaca-bezerro utiliza aproximadamente 70% dos recursos naturais, olhando a ocupação de área. Por isso, a eficiência reprodutiva tem grande impacto na eficiência da lucratividade e na sustentabilidade do sistema de produção. Se a pecuária melhora sua eficiência reprodutiva “serão necessárias menos vacas para produzir a próxima geração de bezerros, o que reduz a demanda por recursos, a emissão de metano do rebanho e os custos” e é isso que se espera do Brasil.
O uso da ACV permitiu identificar as principais fontes de emissão e garantir a comparabilidade internacional dos resultados, respeitando critérios científicos aceitos globalmente. Isso foi possível justamente porque o estudo seguiu o modelo “cradle to farm gate” — da origem da cadeia produtiva até a saída da fazenda. As emissões diretas e indiretas foram convertidas em CO2 equivalente, a partir de inventários construídos com dados regionais.
Os sistemas de produção de carne e leite no Brasil apresentam uma grande variabilidade regional, influenciada por fatores como clima, solo, vegetação, manejo e genética animal. Por isso, utilizar bases de dados internacionais sem adaptações comprometeria a representatividade dos resultados. “Nosso grupo de pesquisa realizou estudos anteriores para quantificar a pegada de carbono nos sistemas de corte e leite conforme o bioma (Amazônia, Caatinga, Cerrado, Pantanal, Mata Atlântica e Pampa)”, diz Vanessa. “Para o cálculo, utilizamos uma metodologia de avaliação de ciclo de vida, validada internacionalmente e adaptada às condições brasileiras de manejo. No presente estudo, foi considerado, na modelagem, o impacto dos diferentes biomas nas matrizes que receberam IATF”.

Rodrigo Faleiros, diretor superintendente da UCBVET Saúde Animal
Os pesquisadores construíram ICVs com dados regionais e nacionais, utilizando dados da Embrapa Gado de Leite e da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (ABIEC), informações de propriedades localizadas nas principais regiões produtoras e modelos preditivos adaptados às condições tropicais. Para Vanessa, “tecnologias que aumentam a eficiência dos sistemas, como a IATF, naturalmente estão ligadas à mitigação de emissões e podem atuar em sinergia com outras práticas, como a integração lavoura-pecuária-floresta e biodigestores.”
Essa abordagem diferenciada foi apontada como um dos principais ganhos metodológicos do estudo técnico. A regionalização dos dados, segundo os autores, contribui para formular estratégias mais eficazes de mitigação dentro da realidade produtiva brasileira e era exatamente isso que buscava a GlobalGen: a tecnologia surge como ferramenta estratégica para atender às exigências globais por alimentos sustentáveis.
“O estudo mostra que a biotecnologia da IATF, além de economicamente importante, reduz potencialmente a pegada de carbono da pecuária. Portanto, é uma prática sustentável”, afirma Rodrigo Faleiros, diretor superintendente da UCBVET Saúde Animal, controladora da GlobalGen, com negócios centrados na expansão da IATF, é controlada pela UCBVET Saúde Animal (uma das principais indústrias brasileiras de medicamentos veterinários) em sociedade com a holding americana ReproGen, dos pesquisadores Richard Pursley e Milo Wiltbank, que são os criadores do protocolo original de IATF que revolucionou a reprodução bovina no mundo.
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