Por Que Essas Uvas Crescem Melhor na Face de Um Vulcão

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As encostas acidentadas e ricas em minerais da face norte do Monte Etna, na Sicília, Itália, oferecem um ambiente cada vez mais raro para o cultivo da nerello mascalese, uma uva nativa valorizada por sua complexidade e estrutura.

Em altitudes elevadas de um vulcão ativo, as condições parecem, paradoxalmente, ideais. O solo vulcânico e os ventos refrescantes permitem que a uva amadureça lentamente, desenvolvendo um perfil de sabor único, moldado por essa paisagem dramática. Mas as mudanças climáticas estão pressionando as características distintivas que definem essa uva, com temperaturas mais altas e clima imprevisível.

Na face norte do Etna, o solo vulcânico jovem se renova constantemente, criando um ecossistema incomum. “A peculiaridade dele é que ele está em constante evolução”, explica Diego Cusumano, coproprietário das vinícolas sicilianas Cusumano Winery e Alta Mora Wines, conhecidas pela produção de nerello mascalese. “A lava e as cinzas criam um sistema em constante ‘fermentação’, onde a energia se mantém em níveis elevados, o dióxido de carbono é retirado da atmosfera e a vida é continuamente gerada.”

Esses solos ativos contêm altos níveis de minerais como potássio, fósforo, magnésio e cálcio — nutrientes que ajudam as videiras a resistirem aos estresses ambientais e permitem a produção de uvas vigorosas e saborosas.

A elevada altitude da face norte do Etna é outro fator que desempenha um papel crucial porque proporciona temperaturas mais baixas do que em outras partes da Sicília, mesmo nos meses mais quentes. Esse fenômeno desacelera o processo de amadurecimento das uvas, resultando em vinhos com acidez equilibrada e sabores refinados.

“As temperaturas mínimas médias em setembro e outubro, por volta dos 14 °C, criam condições ideais para retardar o amadurecimento das uvas, favorecendo o metabolismo secundário dos aromas e compostos que agregam profundidade e complexidade ao sabor”, diz Cusumano. “Essas temperaturas ajudam a preservar o frescor natural dos mostos e dos vinhos.”

Além da altitude, a combinação do solo vulcânico com o regime de chuvas cria condições únicas, diferentes das de outras regiões vinícolas da Sicília e até de outras zonas vulcânicas, como Vulture e Taurasi, também na Itália.

Divulgação – Forbes EUA

Os solos vulcânicos contêm altos níveis de minerais como potássio, fósforo, magnésio e cálcio

Cusumano descreve o clima do Etna como “uma combinação do nível ideal de chuvas para o crescimento e amadurecimento das videiras e de temperaturas frescas”. Esse equilíbrio delicado permite que as videiras prosperem de forma que não conseguiriam em áreas mais quentes e com menor altitude. Isso mantém o caráter único do nerello mascalese, em um momento em que as mudanças do clima afetam a produção de vinhos em escala global.

Mas há complicações. O aumento das temperaturas médias e os padrões de chuva imprevisíveis estão alterando o ciclo de crescimento. O microclima mais fresco da face norte oferece alguma resistência, mas os viticultores precisam adaptar suas práticas para manter a qualidade.

“O desafio é canalizar a energia da terra para as uvas e, por fim, para o vinho”, afirma Cusumano, destacando que controlar o vigor das videiras se tornou cada vez mais complexo. Podas curtas e rigorosas ajudam a conter o crescimento exuberante das videiras, enquanto a escolha criteriosa das parcelas onde a água alcança as raízes no momento certo é essencial.

“A videira precisa ser capaz de se adaptar para passar de um clima frio de inverno para o calor do verão e, depois, voltar a condições mais frescas no final do amadurecimento”, acrescenta.

Os solos vulcânicos e a topografia desafiadora das encostas do Etna acrescentam outra camada de dificuldade. Os terraços moldados por antigos fluxos de lava limitam o espaço para vinhedos, e o trabalho manual continua sendo a única opção em muitas áreas. A maior parte das operações nos vinhedos é feita à mão, já que o cultivo mecanizado costuma ser inviável no terreno íngreme.

“Talvez o maior desafio seja que a maioria das nossas operações é feita manualmente, porque trabalhamos com pequenas parcelas e terraços moldados pela lava, onde os vinhedos são plantados”, diz Cusumano.

Ventos constantes, combinados com temperaturas mais baixas à noite, preservam a acidez das uvas e permitem o desenvolvimento de taninos complexos, que contribuem para a estrutura e a maciez do vinho.

Segundo Cusumano, essas temperaturas “favorecem a polimerização dos taninos, resultando em taninos densos e macios, que conferem densidade ao paladar”. A combinação entre clima, altitude e solo resulta em vinhos reconhecidos por sua profundidade e elegância sutil, diferenciando-os de outros vinhos sicilianos e até de outras regiões vinícolas vulcânicas.

À medida que os viticultores do Etna enfrentam desafios, cresce também a consciência sobre as vantagens únicas da face norte. A reputação do nerello mascalese cresceu consideravelmente, e há hoje um mercado global interessado nos vinhos distintos dessa área vulcânica.

Com a indústria do vinho sendo afetada pelos efeitos das mudanças climáticas, a face norte do Etna pode se tornar ainda mais crucial para a produção de uvas capazes de resistir a essas transformações. Cusumano acredita que o terroir desta região continuará evoluindo em sintonia com o clima.

“O nerello mascalese cultivado no lado norte do Monte Etna está em constante evolução e aprimoramento, graças ao desenvolvimento dinâmico de seus solos, a um clima altamente favorável à qualidade e a uma notável resistência às variações climáticas”, afirma.

* Rachel King é colaboradora da Forbes EUA, onde escreve sobre luxo, vinhos, destilados, viagens e tecnologia.

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