Conclave – o que o filme ensina sobre política. Por Karine Borges de Liz

Karine Borges de Liz escreve sobre o filme Conclave e suas tramas que espelham a política.

Confira a comparação do filme Conclave com a política atual.

“A política é a arte do possível”. (Otto Von Bismarck)

Em 1958, Angelo Roncalli era eleito Papa aos 77 anos.

Com tal idade, naquela época, e considerando-se que a instituição milenar que iria comandar passava por sérios problemas e estava inserida num mundo em complexa transformação, não se esperava dele além do que o cumprimento de um mandato curto, de transição para um Papa mais jovem.

De fato, pouco mais de 4 anos depois (1963) o Papa João XXIII falecia.
Porém, contrariando as previsões, ele se tornou um dos Pontífices mais revolucionários da História, e um líder mundial respeitadíssimo por sua habilidade política e sensibilidade humana.

João XXIII percebeu, por exemplo, que naqueles meados do século XX: (a) a televisão estava mudando estruturalmente a comunicação política com a sociedade; (b) que apesar das dificuldades as mulheres ingressavam vida pública, (c) e que ao dar força à democracia ele estava a fortalecer a preservação da dignidade humana.

Não por acaso, no recente filme “Conclave” há duas citações a João XXIII.
Uma direta e cômica – provavelmente em alusão ao seu marcante bom humor; e outra indireta e profunda, relacionada às grandes responsabilidades da missão de um Papa.

Interessante, que embora “Conclave” retrate a dinâmica da política do clero, ele não se limita a tratar da política no clero.
Na verdade, esse ótimo filme é um compilado de lições preciosas e milenares sobre política em geral e humanidade.

Isso fica claro já no início, por um discurso marcante do Cardeal Lawrence no qual ele fala do risco das certezas. Das certezas que nos fecham para o diálogo, para a compreensão, para o bom senso.

No filme também se discute a crise de fé nas instituições humanas, os graves conflitos mundiais que estamos vivendo, e o resultado amargo de algumas soluções que tomadas no cotidiano parecem práticas, mas que não raro comprometem tristemente vidas inteiras.

O filme discute sobre ética de uma maneira eloquente – pelo silêncio e pela omissão de muitos humanos, que voluntariamente ou não serão cumplices de tragédias individuais ou de milhares de pessoas em conflitos armados.

Conclave debate, de maneira adulta, o acirramento de opiniões políticas contrárias no mundo, sem uma romantização infantilizada por vezes tão comum nas redes sociais.

Ou seja, Conclave nos chama para a realidade. Ela que é, via de regra, algo difícil de se entender e de se lidar – pois não somos apenas raciocínio, somos seres essencialmente emocionais.

No mais, a fotografia do filme é belíssima, as atuações formidáveis e o roteiro primoroso – como um bom jogo de xadrez, que também aparece no filme.
Enfim, Conclave é um filme humano, “demasiado humano”, como diria Friedrich Nietzsche


Karine Borges de Liz é Especialista em Direito Eleitoral (PUC-Minas), membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político – ABRADEP.

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