4 Lições de Uma Década Empreendendo

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Você quer empreender? Quer mesmo? Então vamos fazer um teste. Deixe o romantismo de lado e troque “empreender” simplesmente por “trabalhar muito”. Você até pode ter outras motivações, mas se essa não for a primeira e a principal, na minha opinião, você provavelmente não quer empreender.

Talvez você queira um emprego – e não há nada de errado com isso. É possível que esteja em busca do “pote de ouro”, do “pulo do gato” – que podem surgir, mas dependem menos de você. Mas, se você acredita que quer ser a pessoa responsável por gerar a própria renda e a dos outros que trabalham com você, sem garantias e com muitos riscos envolvidos, é melhor pensar bem.

Dizendo assim, pode parecer que eu mesma estou sendo romântica. Afinal, será que alguém empreende porque realmente gosta de trabalhar muito? Não seria mais honesto dizer que trabalhamos – na empresa de outras pessoas ou na nossa própria – para, acima de tudo, ganhar dinheiro? Talvez, de fato, essa seja a real motivação primária. E talvez eu não pense muito sobre ela porque, como a maioria das pessoas, preciso trabalhar para pagar as contas. Não se trata de uma opção.

Logo, encaro como premissa. Não sei como seria trabalhar se não precisasse. Pode ser que eu descobrisse que toda a intensidade que dedico, com alegria e disposição, ao trabalho, fosse canalizada para algum hobby ainda desconhecido. Pode ser que eu preferisse viajar pelo mundo. Tudo pode ser, no campo das ideias. Quem sabe, um dia saberei.

Mas o que tenho para hoje é que ainda preciso trabalhar para sustentar minhas necessidades e desejos materiais – e, por sorte, faço aquilo que parece ser minha vocação e meu deleite. Mas não, não precisava empreender. Empreendi porque quis, porque escolhi trabalhar muito. Trabalhar mais do que antes. Trabalhar em atividades que vão além das competências profissionais pelas quais eu era reconhecida. Mais precisamente, trabalhar em qualquer tarefa necessária para a sobrevivência e o crescimento do negócio – da limpeza de um escritório ao desenvolvimento de sofisticadas planilhas de precificação.

Em 2025, celebro uma década de Atelier de Conteúdo. Entro para uma microscópica estatística: 0,08% das empresas sobrevivem após dez anos no Brasil, segundo um levantamento da BigDataCorp. Nesses dez anos, aprendi muitas lições que contestam, de forma empírica, o romantismo comumente associado ao empreendedorismo. Compartilho a seguir as mais valiosas:

1. Cada pessoa é movida por diferentes incentivos

Quanto antes entender isso, mais chances de crescer em boa companhia. Para algumas pessoas, a flexibilidade de horários é o ativo mais valioso; para outras, é a forma de remuneração; há aqueles que buscam reconhecimento ou superação; e quem queira previsibilidade.

Como líderes, precisamos entender: o que motiva cada um? Assim, podemos chegar a uma equação ganha-ganha, em que se compartilha o melhor da empresa com as pessoas, e o melhor das pessoas com a empresa.

2. Nada é mais importante que entregar um produto excelente

Apresentações impecáveis, ambientes inspiradores, rituais de cultura corporativa — tudo isso só tem valor se gerarem resultados tangíveis para os clientes.

Ao longo desses anos, investi em criar espaços que potencializassem nosso ofício criativo. Organizamos retiros, casas criativas e encontros para discutir desafios e motivações. Esses momentos, porém, só fazem sentido quando culminam em entregas excepcionais. É a qualidade do trabalho final que faz o telefone tocar e novos clientes baterem à porta semana após semana, não os processos que utilizamos para chegar até ele.

3. Processos devem servir às pessoas, não o contrário

Um dos maiores desafios do crescimento empresarial é não se perder nos processos. Quando uma organização cresce, logo as pessoas estão gastando mais tempo cumprindo protocolos, preenchendo planilhas e participando de reuniões do que executando o trabalho que gera valor.

Ferramentas processuais deveriam otimizar, simplificar e organizar, não se tornarem o fim em si mesmas. É preciso presença de espírito para perceber quando esses processos envelhecem, ficam burocráticos e pesados. Nesses dez anos, aprendi a buscar o equilíbrio: ter a maturidade institucional para manter processos essenciais, mas agilidade para abandonar burocracias que só se justificam em determinados contextos.

4. Respeite os ciclos fisiológicos do negócio

Uma empresa respira: expande e retrai como um organismo vivo em constante adaptação. O Ateliê começou apenas comigo, cresceu para uma equipe de 15 pessoas e hoje retorna a uma estrutura mais enxuta – porém infinitamente mais madura e preparada para voos maiores.

Essa é a natureza dos negócios: impermanência e fluxo. Mas aqui está o ponto crucial – quando finalmente colhemos os frutos de anos de trabalho árduo, é exatamente o momento de intensificar o plantio, não de relaxar. Se, ao obter os primeiros resultados, decidirmos apenas “curtir a vida”, logo tudo minguará.

Nossa constante demanda de clientes vem não apenas da qualidade das entregas, mas desse estado permanente de alerta e inquietação que nos mantém prontas para nos reinventar. Não importa o quanto já tenha conquistado; o sucesso sustentável exige movimento contínuo. A vida – e os negócios – acontecem onde há presença e ação deliberada.

No ano em que o Atelier completa dez anos, renovo meus votos: sim, quero mesmo empreender. Hoje sei o que isso significa com muito menos romantismo e muito mais pé no chão. Estar ancorada nas minhas próprias decisões para navegar as oportunidades de mercado e enfrentar os desafios já não me tira o sono como no início. Sei que não me faltarão as ferramentas necessárias se eu estiver pronta para empreender — ou seja, trabalhar muito.

Ariane Abdallah é jornalista, autora do livro “De um gole só – a história da Ambev e a criação da maior cervejaria do mundo” e fundadora do Atelier de Conteúdo, empresa especializada na produção de livros, artigos e estudos de cultura organizacional. 

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