Opinião | Perseguido, mas nem tanto: a vida boa de quem diz viver sob um regime opressor

No Brasil, de tempos em tempos, surge alguém dizendo que está sendo vítima de perseguição política e judiciária. A narrativa é sempre a mesma: um herói injustiçado, combatendo forças ocultas que querem silenciá-lo. Mas, curiosamente, esse herói nunca está de fato silenciado. Pelo contrário, dá entrevistas, faz lives, viaja para lá e para cá, recebe homenagens e é recebido por apoiadores com tapete vermelho.

Enquanto brada aos quatro ventos que vive sob um regime opressor, aproveita as garantias de um país democrático. Critica as instituições, mas recorre a elas sempre que lhe convém. Reclama da Justiça, mas aciona o Judiciário quando se sente lesado. Diz que não há liberdade de expressão, mas está na TV, no rádio, nos jornais e nas redes sociais falando o que bem entende.

O curioso é que, em muitos casos, esses mesmos personagens não escondem o desejo de um regime mais rígido, onde a democracia seja substituída por um governo de mão de ferro. Defendem censura para quem pensa diferente, mas choram quando são cobrados por suas próprias palavras. Querem punição para seus adversários, mas se dizem vítimas quando enfrentam as consequências de seus próprios atos.

Vivemos em um país democrático, onde até mesmo setores que se apresentam como “moderados” e “institucionalistas”, como o Partido Novo, puderam participar de manifestações pedindo a saída do presidente Lula. Isso acontece porque, ao contrário do que pregam os que se dizem perseguidos, o Brasil não é uma ditadura. Aqui, diferentes vozes podem se expressar, criticar o governo e defender suas ideias sem que isso implique prisão ou exílio, como ocorreria em regimes realmente autoritários.

No fundo, o discurso da perseguição é um escudo conveniente. Funciona bem para manter a base mobilizada, levantar fundos e evitar que as pessoas percebam o que realmente está acontecendo. Afinal, se há uma conspiração contra alguém, não há espaço para discutir erros, falhas ou responsabilidades. Tudo se reduz a uma luta do bem contra o mal, onde o herói injustiçado precisa ser defendido a qualquer custo.

Mas os fatos teimam em contradizer essa narrativa. Quem realmente vive sob perseguição política não desfila livremente pelas ruas, não recebe condecorações e não tem palco para espalhar sua versão dos acontecimentos. Basta olhar para países onde a ditadura é real para entender a diferença entre ser um opositor perseguido e ser um político que enfrenta a Justiça dentro das regras do jogo.

No fim das contas, é sempre bom lembrar: a democracia brasileira pode ter seus problemas, mas continua permitindo que até os que dizem estar sendo perseguidos possam aproveitar suas liberdades – muitas vezes, mais do que gostariam de admitir.

Marco Antônio André, advogado e ativista de Direitos Humanos

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