Café sob Pressão: É Hora de Clima Extremo, Preços Altos e Consumo em Mudança

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Vai faltar café na xícara? Vai ter café para todo mundo? Quem vai conseguir comprar? O café, um negócio global e vital para o agro do Brasil, atravessa um período de grandes desafios. E eles não são poucos, marcados por mudanças climáticas severas, muitas oscilações drásticas nos preços atuais e novas regulamentações internacionais que impactam toda a cadeia produtiva. No final de 2024, o preço da saca de 60 kg estava na faixa de R$ 2.300, um recorde histórico; na semana passada custava R$ 2.596, segundo o Cepea/USP.

A Forbes conversou com Vanusia Nogueira, diretora executiva da Organização Internacional do Café (OIC), com sede em Londres, a brasileira que assumiu o cargo em 2022, sobre o atual cenário. A produção global em 2025 está prevista em 176 milhões de sacas, volume 4,2% acima do ciclo anterior. O Brasil é o maior produtor, com atuais 54,78 milhões de sacas, equivalente a 31% da produção global, seguido por Vietnã com 29,1 milhões (16,5%) e Colômbia, com 12,4 milhões de sacas (7%), mas há produções com alguma relevância também na Colômbia, Indonésia, Etiópia, Honduras, Índia, Uganda, México e Peru. O mercado global exportador foi da ordem de US$ 225,1 bilhões no ano passado.

A volatilidade dos preços do café indicada nas bolsas de valores tem sido uma grande preocupação nos últimos anos. “Chegamos a um patamar que é ótimo para os produtores, mas está estrangulando o resto da cadeia”, disse Vanusia. O aumento dos preços se deve, em parte, à queda na produção do Vietnã e da Indonésia, fazendo com que o Brasil assumisse uma fatia maior da exportação do café, principalmente o robusta. “Nunca se exportou tanto canéfora no Brasil, como no ano passado. Mas também chegou um momento que ele acabou”, explicando o motivo de picos nas bolsas.

Apesar das dificuldades, Vanúsia acredita que o mercado de café tem capacidade de adaptação. “O setor tem uma resposta rápida. O desafio é evitar os ciclos extremos de preços”, afirmou. Segundo ela, a lógica do mercado de café segue um padrão: “Quando o preço está lá em cima, um monte de gente planta. Daqui a dois ou três anos, esse café aparece e os preços caem de novo. Precisamos trabalhar para suavizar esses movimentos bruscos”.

Mas o atual alto custo do café tem levado os consumidores a repensar seus hábitos. “Por exemplo, nos mercados maduros, estamos vendo uma migração do consumo fora de casa para dentro de casa”, diz Vanúsia, visando diminuir gastos com a bebida. No Brasil, onde a alta dos preços tem impacto ainda maior, o custo do café já ultrapassa um dia de trabalho, tomando como medida o salário mínimo. “Isso reduz o consumo e pode gerar uma queda na demanda a longo prazo.”

Café com Mudanças Climáticas e Novos Consumidores

Desde 2021, o Brasil e outros grandes produtores de café enfrentam eventos climáticos extremos, que afetam a produção e a qualidade dos grãos. “Cada ano o Brasil tem uma justificativa climática para uma certa frustração de safra”, diz Vanúsia, referindo-se a geadas, calor intenso e estiagens prolongadas. Além do Brasil, países como Vietnã e Indonésia também registram problemas semelhantes. “Estamos vendo uma seca tremenda no Vietnã, na Indonésia. Essas questões climáticas precisam ser endereçadas com urgência.”

Para minimizar os impactos, a OIC tem incentivado e levado em frente a necessidade de mais pesquisas para desenvolver variedades mais resilientes e incentivar práticas sustentáveis. “Precisamos de um esforço coordenado para renovar lavouras e expandir a agricultura regenerativa. Isso inclui melhor manejo do solo, recuperação da biodiversidade e uso mais eficiente da água”, diz ela. Vanúsia também destaca a necessidade de financiamento a pequenos produtores, permitindo que adotem tecnologias que mitiguem os impactos climáticos. “É essencial apoiar financeiramente esses agricultores, porque a transição para métodos mais sustentáveis demanda investimentos consideráveis.”

Além dos desafios climáticos e financeiros, os produtores de café enfrentam novas regulamentações internacionais, como a lei da União Europeia contra o desmatamento. “A gente teve que trabalhar com muito dinamismo para encontrar uma solução viável para todos”, afirmou. Segundo Vanúsia, essas regras impõem desafios adicionais para os países produtores, que precisam provar que sua produção não contribui para o desmatamento.

Ainda na seara internacional, uma conquista importante para o setor foi a inclusão do café na agenda do G7 (Grupo dos Sete) formado pelas maiores economias do mundo (Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Itália, Japão e Reino Unido. “O café agora faz parte das discussões do G7 sobre segurança alimentar, porque a geração de renda para pequenos produtores é crucial”, afirma Vanúsia. A decisão reconhece o papel do café na economia de países em desenvolvimento e pode abrir portas para novas iniciativas de financiamento e suporte técnico.

Acertar a cadeia é fundamental porque há demanda por café no mundo, e ela não é pequena. Mercados tradicionais podem até apresentar uma certa estagnação, mas na Ásia, por exemplo, a demanda pela bebida cresce. Os atuais US$ 225,1 bilhões em exportações devem crescer a uma taxa anual composta (CAGR) de 5,80% até 2031,chegando a US$ 334,1 bilhões, estima a Cognitive Market Research.

“China, Filipinas, Tailândia e Índia estão seguindo os passos do Japão e da Coreia no consumo de café”, diz Vanúsia que, segundo ela, ainda são mercados em desenvolvimento, juntamente com o Oriente Médio. “Nessa região, onde o consumo de álcool é restrito, o café tem se tornado uma alternativa de socialização para os jovens.” Esse novo comportamento abre oportunidades para exportadores, mas exige estratégias específicas de marketing e distribuição. Além do aumento do consumo em mercados emergentes, a popularidade crescente de cafés especiais e a expansão de grandes redes de cafeterias em todo o mundo também empurra o mercado.

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