Patentes na Moda: é Possível Proteger o Design de Uma Roupa?

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Roupa tem dono? No mundo da moda, onde as tendências se espalham na velocidade da internet, proteger uma criação é um desafio quase tão complexo quanto desenhá-la. Mas Cassey Ho, empresária e influenciadora por trás das marcas Popflex e Blogilates, conseguiu um feito raro: graças à patente que detém sobre seus modelos de roupas fitness, ela derrubou 499 cópias de suas peças do mercado. A decisão reacendeu uma velha discussão no setor: afinal, até que ponto é viável patentear o design de uma peça de vestuário? E quais são os desafios legais e práticos dessa proteção?

 

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Uma publicação compartilhada por Cassey Ho (@blogilates) 

O diretor criativo Giovanni Bianco explica que os direitos autorais protegem apenas a parte artística de uma peça, enquanto as marcas registradas garantem a identidade da empresa, mas não necessariamente o design de uma roupa. Em outras palavras, isso significa que uma marca pode proteger seu logotipo ou um padrão específico, mas não pode impedir que outra empresa crie uma roupa parecida, desde que não use esses elementos registrados. “A Chanel, por exemplo, registrou o design matelassê da icônica bolsa 2.55 em 1955, e a Gucci protegeu sua famosa faixa verde e vermelha como marca registrada”, exemplifica Bianco.

Proteger o design de roupas e acessórios é um assunto complicado. De acordo com a Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI), partes de uma bolsa, por exemplo, podem ser patenteadas, mas só se forem realmente novas, úteis e diferentes do que já existe no mercado. Um exemplo é a Louis Vuitton, que registrou sua primeira patente em 1890 para um fecho superseguro, usado até hoje. Já em 2020, a marca patenteou um modelo da bolsa Keepall com uma tela OLED flexível dentro dela.

Para a empresária e consultora de moda Costanza Pascolato, o que define se algo pode ser patenteado ou não é a originalidade. “Se a peça não é completamente nova, não pode ser considerada original. Tanto o design quanto o material precisam ser inéditos para que haja proteção legal”, explica. O problema é que as tendências da moda mudam rápido e, muitas vezes, uma pequena alteração no design já torna uma cópia legalmente válida.

A jornalista e empresária Gloria Kalil lembra que já viveu esse dilema nos anos 1980, quando trabalhou na marca Fiorucci e viu peças sendo falsificadas em massa. “A lei existe, mas proteger o design é muito difícil. Se alguém muda um detalhe, já não é mais considerado cópia”, diz. Um caso famoso é o da bolsa Birkin, da Hermès, que foi amplamente copiada por uma grande rede de lojas. “A cópia exata é proibida, mas basta uma pequena mudança e pronto: juridicamente, ela se torna um novo produto”, explica Kalil.

Para entender melhor as nuances legais da proteção de designs no Brasil, o consultor do Pinheiro Neto Advogados, Márcio Junqueira Leite, esclarece que, diferentemente do que muitos pensam, o termo “patentear” não se aplica ao design de moda. “O correto é falar em proteção do desenho industrial, que, de acordo com a lei, é ‘a forma plástica ornamental de um objeto ou o conjunto ornamental de linhas e cores que possa ser aplicado a um produto, proporcionando resultado visual novo e original na sua configuração externa e que possa servir de tipo de fabricação industrial’. Assim, o desenho industrial pode proteger novas criações de peças e acessórios que tenham um resultado novo e original”, explica.

Casos famosos ilustram as diferentes formas de proteção no mundo da moda. “A Gucci registrou o padrão de seus tecidos como desenho industrial, enquanto a Osklen protegeu os três ilhoses na parte frontal de seus tênis como ‘marca de posição’ no INPI. Já a Hermès conseguiu o reconhecimento da bolsa Birkin como uma criação artística original, garantindo proteção pelo direito autoral”, exemplifica Leite.

Hermès

A Birkin foi um modelo altamente copiado antes de a Hermès conseguir a patente sobre o design

O consultor também detalha o processo de registro de desenho industrial no Brasil, que é feito pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI). “O registro tem validade de 10 anos, prorrogáveis por até três períodos sucessivos de 5 anos cada. Ele protege a aparência estética de um produto, mas não suas funcionalidades, vantagens práticas ou materiais”, explica. “Para ser registrado, um design precisa ser novo, original e passível de reprodução industrial”, completa.

No caso de Cassey Ho, além da proteção legal, suas peças ganharam ainda mais notoriedade após celebridades como Taylor Swift usarem seus modelos. A cantora popularizou o “Pirouette Skort”, da Popflex, impulsionando as vendas e consolidando a peça no mercado.

Apesar disso, proteger designs na moda continua sendo um desafio. A velocidade com que tendências se espalham e a facilidade de reprodução dificultam a proteção efetiva. Além disso, patentear cada modelo é uma prática financeiramente inviável para muitos designers. “O custo é altíssimo e, com a rapidez da moda, não vale a pena proteger cada criação”, conclui Kalil.

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