A Mesa como Refúgio: Como o isolamento reaproximou as famílias

Retomar a escrita sobre gastronomia e seus inúmeros aspectos – daí a expressão “outras folias” – me fez refletir sobre as pausas que possuem o poder de ressignificar o próximo passo a ser dado. Em um mundo cada vez mais dinâmico, apressado e, por que não dizer, ansioso, o ato de alimentar-se tornou-se sinônimo de refeições prontas, envoltas em plásticos e papéis, que são rapidamente preparadas em poucos minutos.

Na contramão desse fluxo, veio a pandemia. Com ela, o isolamento domiciliar, a impossibilidade de percorrer os vastos corredores dos supermercados, o fechamento dos restaurantes e a suspensão dos serviços de entrega. Restava a você e à sua família, a imperiosa necessidade de alimentar-se.

Diante desse cenário, ficamos frente a frente com legumes, verduras, grãos, lácteos, carnes, tudo no seu modo in natura, e prepará-los, muitas vezes, se tornou o momento de lazer para aquele grupo confinado. Se a comida une desde que o mundo é mundo, na pandemia – mais especificamente no período de confinamento rigoroso – ela consolidou a sua função de integrar indivíduos que, embora compartilhassem o mesmo espaço físico, raramente se reuniam à mesa devido à rotina frenética e aos horários inflexíveis.

Esse contato direto com os alimentos despertou uma percepção mais acentuada acerca do que, de fato, consumimos em nossa rotina. Rompemos com a relação superficial e distanciada que até então predominava, em que o encontro entre nós e os alimentos se dava apenas no momento em que já estávamos prontos para o ato mecânico de comer. Em seu lugar, instaurou-se uma conexão mais profunda e íntima, onde só a convivência diária e contínua pod em proporcionar.

A imersão na diversidade de cores, sabores, aromas, formas e texturas que os alimentos oferecem resgatou a ancestralidade da alimentação: a comida preparada na cozinha de casa, por nós ou por um dos nossos. Mais do que isso, esse reencontro com a prática culinária trouxe à tona um resgate das antigas tradições familiares, das histórias que, entre risos e nostalgias, se entrelaçam ao redor da mesa. As conversas e relatos que surgem à medida que o prato é servido revigoram também as “novas receitas de família”, aquelas que, com o tempo, se tornam parte do patrimônio afetivo de cada lar, perpetuando sabores e memórias que se transmitem de geração em geração.

O confinamento nos levou a olhar o alimento como parte essencial e integradora da experiência diária. Voltar a prestar atenção ao que comemos, como preparamos e compartilhamos nossas refeições, foi mais do que uma adaptação momentânea, foi um resgate de significados mais profundos, um processo que perdura para além do período de isolamento. De uma ação puramente funcional, tornou-se um ato de cuidado, de partilha e de conexão. 

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