Opinião | A carroça balança, as abóboras se ajeitam: e o mundo não vai acabar

Curioso como 2025 mal começou e já parece ter idade para se aposentar. Quarenta dias que pesam como quatro décadas. Trump voltou à Casa Branca há menos de um mês e o planeta já gira diferente – ou será que somos nós que estamos girando rápido demais?

Não, o globo não está capotando na curva. Calma, pequeno gafanhoto. O mundo não vai acabar amanhã. Nem depois de amanhã. Nem no fim do mês, apesar da fatura do cartão dizer o contrário. Já atravessamos pandemias, hiperinflações, ditaduras e, veja só, ainda estamos aqui.

Não é à toa que “Ansiedade” foi coroada a palavra do ano em 2024 aqui no Brasil. Vivemos em uma época em que o amanhã insiste em chegar antes do hoje, numa corrida maluca na qual todo mundo parece ter certeza de que vai chover canivetes abertos no próximo amanhecer.

E é uma gritaria danada. “Você já investiu hoje?” “Vale a pena tanto esforço?” “Tem que correr atrás!” “Olha só o fulano que começou um negócio ontem e já está milionário!” Como se a vida fosse uma olimpíada na qual só se sobe ao pódio quem consegue antecipar o próprio futuro.

Na família, minha irmã Daiane é quem entende da psique humana. Eu, no máximo, consigo dizer que viver é foda, irmão. Não tem manual, não tem ansiolítico que dê conta de tudo. Se você não nasceu herdeiro – nem teve a bunda beijada pela lua da sorte – vai precisar, como eu, ralar o joelho e, ainda assim, encontrará uma frustração imensa pelo caminho.

Como diria Deborah Levy, “o caos é, em tese, o que mais tememos, mas cheguei à conclusão de que talvez seja o que mais queremos”. Será mesmo? Porque, olha, temos feito um trabalho excepcional em fabricar caos particular, transformando cada notificação do celular num pequeno terremoto existencial.

As redes sociais se tornaram um catálogo de vidas perfeitas, onde todo mundo é CEO, viaja para as Maldivas e toma café da manhã com abacate importado. Enquanto isso, a gente aqui, rindo de nervoso, tentando descobrir se o sucesso está atrasado ou se pegou o ônibus errado.

Porque os sonhos chegam muito antes da realidade. O desejo sempre parece alguns passos à frente, piscando no horizonte, como se dissesse: “chega mais!” A gente corre, tropeça, chega perto… e ele recua, feito miragem.

Como no mito do rei grego Sísifo. Depois de desafiar os deuses, enganar a Morte e Hades, foi condenado por Hermes, o deus mensageiro, com o castigo de rolar uma pedra até o alto de uma colina. A sacanagem do deus foi sabotar o cumprimento da tarefa sempre que Sísifo estivesse pronto para concluir. E lá se vai a pedra, rolando para baixo, independentemente do esforço do pobre rei.

Fale a verdade: há momentos em que nossa vida é um tanto assim, não acha? É a representação da eternidade cíclica, em que se faz um esforço sem sentido – a inadequação do ser humano em um mundo absurdo. Você carrega a pedra morro acima e toma pedrada morro abaixo.

A verdade é que ninguém sabe. Nem os economistas, nem os profetas do caos, nem o novo presidente dos Estados Unidos (por mais que finja). A vida tem seu próprio ritmo, como diria Guimarães Rosa: “o correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem.”

Bukowski disse certa vez que “às vezes, um homem tem que lutar tanto pela vida que não tem tempo para vivê-la”. Mas será que não está na hora de dar uma pausa nessa luta? De entender que nem todo dia precisa ser épico, nem toda conquista precisa virar post no LinkedIn? Dá para ser mais simples, não dá? Baixar um pouco a régua das expectativas, sabe?

A verdade é que cada um encontra o seu jeito de domar os pensamentos que galopam sem freio. Uns escrevem, outros plantam suculentas; há gente que faz tricô ou assiste a vídeos de gatinhos no YouTube. Bom, eu faço uma coisa que aprendi com Deborah Levy: “nesse momento de incertezas, escrever é uma das poucas atividades em que eu posso lidar com a ansiedade do incerto, de não saber o que acontecerá em seguida”.

Você sabe como é: eu não nasci herdeiro e minha bunda só recebeu beijinhos, na infância, da minha mãe. E nem preciso dizer que não – ela não se chama Sorte… E tudo bem! Os sonhos chegam antes da realidade, meus joelhos seguem ralados e, é fato, nem tudo que conspiramos ocorre exatamente como imaginamos.

Enquanto isso, a carroça segue balançando e as abóboras continuam se ajeitando. O mundo pode não estar perfeito, mas também não vai acabar. E se acabar, bem… pelo menos não teremos mais que nos preocupar com as parcelas do cartão de crédito.

Tarciso Souza, jornalista e empresário

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