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A licença-paternidade é um tema que ganha cada vez mais atenção no Brasil, impulsionado por movimentos que buscam equiparar direitos e responsabilidades parentais. Hoje, a Constituição garante apenas cinco dias de licença remunerada aos pais em casos de nascimento, adoção ou guarda — um prazo que, na prática, pouco atende às demandas reais das famílias.
Segundo a pesquisa Radar da Parentalidade — realizada em julho de 2024 pela consultoria Filhos no Currículo, em parceria com a Talenses Group e o Movimento Mulher 360 —, mais de 80% dos pais desejam uma licença-paternidade mais longa. Entre eles, 34% preferem um período superior a 21 dias; 26% defendem 120 dias, equivalente à licença-maternidade; e 22%, de 6 a 22 dias. Apenas 11% consideram os cinco dias atuais suficientes. Entre as mulheres, a insatisfação é ainda mais evidente: só 1% aprova o modelo vigente.
Para Thiago Coelho, CEO da Estrella Galicia no Brasil e embaixador da CoPai (coalizão que atua pela ampliação da licença-paternidade), o cenário representa tanto um desafio quanto uma oportunidade para as empresas. “Em cinco dias, você não vê o umbigo da criança cair. O leite materno ainda não desceu”, afirma. “Por isso é tão importante falar desse papel de responsabilidade do pai, que não é ‘ajudar’.”
O executivo defende que a presença ativa do pai, especialmente durante a licença-maternidade, é fundamental — tanto para o cuidado com o bebê quanto para o bem-estar da mãe. “Minha esposa fez cesariana e precisava de alguém para levantá-la da cama. Minha mãe e minha sogra, que são idosas, não conseguiam fazer isso. Quem ia fazer?”, questiona. “A minha licença foi muito pensada, desde o que eu ia fazer nos meus 60 dias, até como a gente ia dividir as tarefas de casa posteriormente.”
Impacto da licença-paternidade
A ausência de uma licença-paternidade adequada impacta diretamente a saúde mental de pais e mães, além de interferir na divisão das tarefas domésticas e no desenvolvimento emocional das crianças. Um estudo da Universidade de Oslo mostra que a licença-paternidade melhora o desempenho escolar dos filhos e reduz a sobrecarga materna, fator frequentemente associado à queda salarial das mulheres. “Pesquisas também mostram que, em lares com maior participação masculina na infância das crianças, há menos violência doméstica, menos abandono e menor evasão escolar”, diz Thiago.
Os benefícios se estendem também à carreira dos pais. Uma pesquisa da consultoria McKinsey revelou que quase 100% dos entrevistados consideraram a experiência positiva. “Hoje, sou um líder mais atento e consciente das minhas falhas. A paternidade me trouxe sensibilidade, empatia e uma certa sabedoria para ouvir.”
Como trazer homens para a discussão
Apesar dos benefícios, ainda há resistência — tanto dentro das empresas quanto entre os próprios homens. Muitos, mesmo tendo direito, optam por não tirar a licença por medo de prejuízos na carreira.
Para ampliar essa conversa, Thiago Coelho participou, na última semana, de um encontro promovido pela AngelUs, rede formada por mais de 350 mulheres que desenvolvem programas para acelerar a equidade de gênero nas empresas. “Enquanto o discurso sobre parentalidade vier só das mulheres, vamos continuar reforçando a ideia de que o cuidado é exclusivamente delas. E isso não é verdade.”
O evento reuniu lideranças para debater os desafios e as oportunidades de incorporar a licença-paternidade e o cuidado familiar à cultura corporativa, reforçando que o tema precisa estar na agenda da alta gestão. “Os homens ocupam 95% dos cargos de CEO. Se eles não entrarem nessa discussão, nada muda. É quase uma questão matemática”, diz Claudia Colaferro, CEO da AngelUs. “Por isso criamos uma agenda de aliados. Queremos mais homens comprometidos, que entendam que a paternidade ativa é parte do avanço da equidade.”
Nesse contexto, Coelho reforça a importância do exemplo dentro e fora de casa. “A cultura da empresa não é o que está na parede, é o que você faz todos os dias. Assim como meu filho me copia, minha equipe observa cada atitude minha como líder.”
Na Estrella Galicia, que oferece dois meses de licença-paternidade, o executivo faz questão de garantir que os funcionários usem o período integral. “No meu caso, é simples: ou você tira a licença, ou eu bloqueio seu computador e te removo dos grupos. O exemplo tem que vir de cima.”
O que esperar pela frente
No Brasil, um projeto de lei que prevê 60 dias de licença-paternidade já foi pautado no Congresso e vem ganhando apoio — um sinal de que o tema deixou de ser tabu e entrou de vez na agenda nacional. “A PL volta à pauta nesta semana. O apoio vem da esquerda, da direita e do centro. Apesar de serem ideologias muito diferentes, todas entendem a importância da paternidade.”
Enquanto isso, no mercado, algumas empresas já foram além da legislação atual. O Grupo Boticário e o Nubank, por exemplo, oferecem 120 dias de licença igualitária para pais e mães, reconhecendo que a parentalidade compartilhada é também um diferencial competitivo. “As empresas que já adotaram a licença-paternidade estendida — como Amazon, Boticário, Coca-Cola e Natura — fizeram isso sem depender da legislação. Isso mostra que entenderam o valor. E nenhuma delas joga dinheiro fora.”
De acordo com um levantamento da Mercer Marsh Benefícios, realizado em 2023, 56% das grandes e médias empresas no Brasil já oferecem licenças parentais estendidas, acompanhando uma tendência global.
Para Thiago Coelho, o objetivo de longo prazo é que o Brasil adote um modelo de licença parental universal, como o de países como Suécia, Noruega e Espanha. No modelo, cada cuidador tem direito a tirar entre oito meses a um ano de licença, que podem ser usados de forma flexível nos primeiros anos de vida da criança, contribuindo para o equilíbrio entre vida pessoal e profissional. “Queremos chegar a um ponto em que a família possa decidir o que é melhor — e que as empresas estejam prontas para apoiar.”
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