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A situação da Tesla já não era boa. Mas o colapso espetacular do relacionamento entre o CEO Elon Musk e o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump — mergulhado em ameaças e insultos — promete causar ainda mais danos à empresa do que a queda nas vendas, a falta de novos modelos e a marca profundamente arranhada. O rompimento abre caminho para uma retaliação federal vinda de uma administração movida a ressentimentos.
Com todo o poder do governo federal à sua disposição, Trump pode intensificar diversas investigações contra a Tesla. A Administração Nacional de Segurança no Tráfego Rodoviário (NHTSA, na sigla em inglês) mantém uma investigação de longa data sobre os recursos Autopilot e Full Self-Driving da companhia, ligados a vários acidentes fatais. Ele também pode pressionar a Comissão de Valores Mobiliários dos EUA (SEC) a revisar a veracidade de declarações públicas feitas por Musk sobre a empresa — além de examinar de perto a grande dependência da fabricação de veículos na China.
A NHTSA também está buscando informações da Tesla sobre seus planos para os robotáxis, às vésperas dos planos de Musk de lançar um projeto piloto em Austin ainda este mês. Não há regras federais para veículos autônomos e robotáxis, que são regulamentados em nível estadual. Mas, dependendo da análise da NHTSA, Trump pode pressionar o governador do Texas, Greg Abbott, a barrar o lançamento da frota autônoma da Tesla.
“A área de ataque disponível contra ele é impressionante”, disse um veterano executivo da indústria automotiva, que pediu anonimato para falar livremente. “A alavanca mais fácil de acionar seria retomar as investigações. Coisas que Elon achava que tinham sido enterradas podem voltar à tona.”
A crescente tensão entre os dois bilionários veio a público na quinta-feira (05), quando Musk criticou duramente o projeto orçamentário que é a grande aposta de Trump — apelidado de “Um Grande e Belo” plano — que aumentará o déficit público em trilhões de dólares, algo que Musk tenta combater por meio do Departamento de Eficiência Governamental (DOGE, na sigla em inglês).
A troca de farpas, feita por meio das redes X e Truth Social, descambou para Musk alegando que Trump não teria sido eleito sem sua ajuda — e até mesmo sugerindo apoio a um eventual impeachment. Trump respondeu com ameaças de “encerrar os subsídios e contratos governamentais de Elon”, o que colocaria em risco os bilhões de dólares em contratos federais da SpaceX para foguetes e satélites. Aliados de Trump, como Steve Bannon — um crítico vocal de Musk — disseram ao New York Times que o presidente deveria abrir investigações sobre Musk, nascido na África do Sul, e até deportá-lo.
Tesla no fogo cruzado
Mesmo que a situação não chegue a esse ponto, os comentários públicos agressivos de Musk contra Trump podem acabar sendo os mais prejudiciais à Tesla em toda a sua história. Em 2022, Musk chegou a chamar o então presidente Joe Biden de “um fantoche molhado” no Twitter (hoje X) e não sofreu nenhuma consequência — Biden simplesmente o ignorou. Mas esse não é o estilo de Trump, um homem conhecido por guardar rancores contra quem considera que o ofendeu. Na condição de presidente, ele tem o controle de agências e políticas federais que podem ser extremamente prejudiciais à Tesla, e já demonstrou várias vezes que não hesita em usar esse poder como arma.
A primeira consequência veio rapidamente: as ações da Tesla despencaram. Os papéis caíram 14% na quinta-feira, o que tirou US$ 152 bilhões (R$ 851,2 bilhões) do valor de mercado da empresa — mais do que o valor somado de General Motors, Ford e Stellantis. No acumulado do ano, as ações da Tesla já recuam 30%.
“Parte da reação negativa dos investidores pode ter vindo da expectativa de que a parceria entre Musk e Trump resultaria em políticas favoráveis à Tesla”, afirmou Loren McDonald, analista-chefe da Paren, empresa especializada em dados do setor de veículos elétricos. “Agora que Trump não está mais do lado de Musk, ele também não precisa mais falar bem da Tesla ou dos carros elétricos. Ele e sua administração podem voltar à narrativa de que veículos elétricos são malignos.”
O investidor Ross Gerber — fã de longa data de Musk, mas que se tornou crítico do bilionário — ecoou essa preocupação.
“Elon surtando com Trump e as ações da Tesla estão levando uma surra. Trump vai devolver o Tesla novo dele dizendo que foi ‘Muskado’. Nada disso é bom para os acionistas. Mas e daí, né? Quem liga pra gente?”, escreveu Gerber, CEO da Gerber Kawasaki Wealth and Investment Management, no Threads. “Alguém, por favor, tire o celular da mão dele! Que inferno! A Tesla está sendo destruída.”
Longo pesadelo
A maior fabricante de veículos elétricos dos EUA já enfrentava um trimestre complicado, com o colapso nas vendas na Europa e na China, agravado por custos mais altos e pelas tarifas impostas por Trump sobre aço, alumínio, autopeças e células de bateria chinesas. O orçamento apoiado pelos republicanos — que Musk despreza e que Trump pretende sancionar até o mês que vem — também elimina os créditos fiscais federais para a compra de veículos elétricos, além de diversos incentivos a projetos de energia limpa e baterias, o que também prejudicará a Tesla.
Na quinta-feira, Trump afirmou na Truth Social que a oposição de Musk ao projeto orçamentário se devia ao fim desses subsídios. Musk, por sua vez, já afirmou publicamente várias vezes que é a favor da eliminação do crédito fiscal. Ainda assim, as chances de que os incentivos sejam restaurados na versão final da proposta orçamentária agora parecem menores.
“Com Musk comprando briga com Trump e com boa parte do Partido Republicano, é pouco provável que Câmara e Senado preservem o crédito fiscal em qualquer formato que possa beneficiar Musk ou a Tesla”, avaliou McDonald.
A incapacidade de Musk de se controlar em público já causou diversos problemas ao longo dos anos. Ele foi multado pela SEC e perdeu o cargo de presidente do conselho da Tesla depois de afirmar falsamente, em 2018, que tinha financiamento garantido para fechar o capital da empresa. Pouco depois, teve de se defender na Justiça de uma acusação de difamação, após chamar um crítico de “cara da pedofilia”. Esse tipo de comportamento preocupa investidores institucionais, incluindo fundos de pensão públicos, que estão especialmente frustrados com a inação do conselho da Tesla em conter o CEO.
“Outro CEO de empresa listada em bolsa jamais teria sido autorizado a negligenciar suas funções diárias como Musk faz. Não existe exceção”, afirmou o tesoureiro do estado de Illinois, Michael Frerichs, à revista Forbes nesta semana. “E, se tivesse tomado atitudes pessoais que prejudicassem a reputação da empresa dessa forma, será que teria sido tratado com a mesma condescendência?”
Agora, com Trump irritado, a situação pode piorar ainda mais — com novas investigações e obstáculos aos planos de robotáxis que Musk tanto promove.
“Com Trump e Musk agindo como crianças ou como ex-namorados ressentidos, Trump pode fazer de tudo para atrasar o lançamento dos robotáxis da Tesla”, disse McDonald. “Não me surpreenderia se Trump começasse a elogiar a Waymo e dizer que a Tesla está anos-luz atrás dela.”
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