Do Churrasco de Domingo à Gestão: Os Bastidores da ADP no Uruguai

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Diego Guigou é responsável pela produção agrícola da Agronegocios del Plata (ADP), uma das maiores empresas do setor no Uruguai e fundada pelo seu pai, Marcos Guigou. Formado em engenharia agronômica em Montevidéu, ele sempre teve como meta retornar às suas origens, em Dolores, cidade conhecida como “a capital do trigo” e com uma economia baseada na atividade agropecuária, para trabalhar na empresa da família. “Cresci no campo, a seis quilômetros de Dolores, e toda a minha infância e adolescência foi marcada por viagens para realizar diferentes atividades, mas sempre voltando para o campo”, conta o jovem executivo.

Ele admite que “gosta muito mais de agricultura do que de pecuária”, mas reconhece que, no cenário atual, os dois negócios são “muito complementares”. De fato, sua empresa conta com confinamentos que são abastecidos com os grãos que ela própria produz, como uma forma de “ganhar eficiência” e diversificar riscos.

Guigou conta que sua família o enganou ao mandá-lo para a capital do país para cursar o sexto ano do ensino médio. Chegando lá, ele descobriu que era um curso pré-universitário, onde “era preciso estudar muito mais” do que no interior. “No fim das contas, foi uma boa preparação”, admite, entre risos. “Fiz a faculdade, mas sempre tive claro que queria voltar para o campo”, afirma.

Em entrevista à Forbes, ele compartilha os bastidores de uma empresa familiar de grande porte e altos padrões, e analisa o nível da agricultura uruguaia e os desafios impostos pelo cenário internacional.

A empresa no “churrasco de domingo”

“Empresas familiares têm uma dinâmica um pouco diferente porque muitos assuntos acabam indo parar no churrasco de domingo ou no aniversário”, diz Guigou.
Ainda assim, existem regras claras e exigências para a gestão da empresa, que ele divide com o pai, a irmã Sofía e o irmão Matías. “Tentamos administrar tudo de forma muito profissional, com um conselho de administração que sempre nos avalia e diante do qual precisamos projetar e depois justificar, com argumentos, por que os resultados não foram melhores”, afirma.

Para Guigou, hoje, o Uruguai “não deve nada” à agricultura mais desenvolvida de países emblemáticos como Estados Unidos ou Brasil, por exemplo. “Estamos muito bem nesse sentido”, diz.

Ele completa que, recentemente, ofereceram para ele uma tecnologia para o pulverizador capaz de informar em tempo real quanto mais ou menos de produto deveria ser aplicado em cada lavoura. “Essas máquinas, no futuro, serão capazes de processar tudo com inteligência artificial, carregando todos os dados históricos e entendendo por que determinadas aplicações deram certo ou não”, conta.

O executivo afirma que fazer agricultura no Uruguai exige um “conhecimento e manejo muito profissional” do que precisa ser feito para evitar a erosão do solo com a construção de terraços, já que os terrenos têm declives – ao contrário dos Estados Unidos ou das planícies argentinas, por exemplo. “Trabalhamos bastante na drenagem, pensando por onde a água vai sair das lavouras”, diz Guigou.

Preservação dos recursos e produtividade

Após um processo intensivo vivido pela agricultura uruguaia nos últimos 15 ou 20 anos, começaram a surgir restrições de ordem ambiental. Atualmente, já são vistas iniciativas privadas como a da Associação Agropecuária de Dolores, que representa os produtores rurais da região e tem como objetivo o desenvolvimento técnico, econômico e sustentável da atividade. A entidade criou um projeto de correção de solo, com aplicação de calcário, em função do baixo pH registrado em várias áreas do país.

“A acidificação (baixo pH) precisa ser tratada. Os países que praticam agricultura há muito tempo já fazem a calagem e corrigem o pH. Talvez dê para comparar com um atleta de alta performance: para atingir o máximo rendimento, ele precisa de uma nutrição muito equilibrada, e quando algo sai do controle, é preciso ajustar para que isso não se torne uma limitação”, diz Guigou.

Ainda assim, ele considera que, graças à estratégia de rotação de culturas adotada ao longo do tempo, a produtividade de diferentes cultivos vem aumentando ano após ano, especialmente nas gramíneas como milho, trigo e cevada. “Esse, para mim, é o melhor indicador de que estamos fazendo as coisas da forma certa. No nosso caso, no trigo, estamos melhorando a uma taxa de 250 kg/ha por ano”.

Por outro lado, o executivo destaca a “oportunidade” que cultivos mais recentes no país, como a carinata, conhecida como mostarda etíope, estão apresentando. O grão dessa planta é utilizado na produção de combustível sustentável para aviação (SAF), substituindo hidrocarbonetos.

A ADP tem, há três anos, um programa interno para medir a pegada de carbono e quantificar quanto de fato sua produção neutraliza de emissões em diferentes etapas da cadeia. “Há um estudo muito interessante dos EUA que mostra que um hectare de milho sequestra o que três carros emitem”, aponta.

Atualmente, o mercado internacional de comercialização de grãos ainda não paga um valor adicional por determinados tipos de certificações ambientais. A maior parte segue sendo negociada como um commodity puro e simples.

“Na verdade, quando você se dá conta de tudo que precisa fazer para chegar a esse nível, se pergunta: quem vai pagar por isso? Por que eu faria tudo isso se não vou ganhar mais?”, questiona. No entanto, ele diz que a empresa continua apostando nessa estratégia para “atribuir números” à produção agrícola e “ter respostas”.

“Estamos convencidos de que o que fazemos sequestra carbono – se fizermos bem-feito”, enfatiza. Ele acrescenta que, como os solos no Uruguai não têm capacidade de armazenar mais de 50 a 60 milímetros de água, a alta densidade de cultivo permite que uma grande parte da água da chuva não escoe para o mar, por exemplo.

Sobre o desempenho da safra de soja em andamento, Guigou se mostra “otimista” com o “potencial” que as lavouras estão apresentando. “Hoje, a maioria das lavouras que visito tem número de grãos suficiente para alcançar produtividades muito altas. Tomara que a colheita seja farta para compensar um pouco a queda no preço”, diz.

* Andrés Oyhenard é jornalista da Forbes Uruguai, onde escreve sobre agronegócio, economia e sustentabilidade. 

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