Opinião | CPIs viram reality show e vereadores, youtubers de mandato

Vivemos tempos estranhos. A política, que deveria ser espaço de debate sério, virou um grande palco de lacrações. Deputados e senadores disputam quem solta a frase mais de efeito, quem gera mais curtidas ou quem aparece mais nos cortes de vídeo das redes sociais. É a “política TikTok”, onde o conteúdo importa menos que a performance.

Mas esse espetáculo não se limita a Brasília. Nas câmaras de vereadores país afora, o teatro é o mesmo — só com menos audiência. Tem vereador que confunde o cargo com um programa de auditório. Em vez de propor leis que melhorem a cidade, gasta tempo fazendo live, gravando vídeo pra lacrar ou perseguindo inimigos imaginários. Alguns se elegem prometendo renovação e ética, mas viram miniaturas dos piores exemplos da política nacional — só que mais barulhentos e menos preparados.

Outro recurso que virou show: as CPIs. Criadas para investigar com seriedade, muitas viraram trampolim de marketing. A Comissão Parlamentar de Inquérito deveria ser ferramenta de fiscalização, mas se transformou em palco para discursos inflamados, disputas partidárias e manchetes vazias. Relatórios mal feitos, depoentes humilhados em praça pública e conclusões que não dão em nada viraram rotina. No fim, as CPIs servem mais para alimentar vaidades do que para esclarecer verdades.

E quando a bagunça aperta, a culpa, é claro, vai para o Supremo Tribunal Federal. Tudo é culpa do STF: se o projeto não anda, se o político fala bobagem e responde na Justiça, se um vídeo racista ou golpista gera consequências. É sempre mais fácil jogar a responsabilidade nos outros do que admitir a própria mediocridade. Afinal, reconhecer que o Legislativo — do Congresso à câmara municipal — tem falhado feio seria admitir que o problema está dentro da casa.

E tem mais: muitos desses políticos tratam a Justiça como ferramenta de marketing. Usam processos e decisões como munição para alimentar a base radicalizada. O Judiciário vira cenário, não pela busca de justiça, mas como peça do roteiro de um teatro vergonhoso.

A verdade é que a política brasileira está doente, e parte da culpa está em quem prefere likes a leis, palco a projetos, vaidade a responsabilidade. A democracia não sobrevive de espetáculo, e sim de compromisso. O povo não precisa de vereadores influenciadores, deputados atores nem senadores roteiristas de CPI. Precisa de representantes.

Enquanto isso não mudar, seguiremos assistindo à decadência institucional transmitida ao vivo — e o ingresso, caro como sempre, é pago por todos nós.

Marco Antônio André, advogado e ativista de Direitos Humanos

Adicionar aos favoritos o Link permanente.