IA sob controle? Lições globais que o Brasil precisa ouvir. Por Marcelo Senise

Marcelo Senise defende a urgência de uma regulação brasileira para a inteligência artificial, inspirada nas experiências internacionais, que equilibre inovação e proteção democrática.

Marcelo destaca o papel da Comissão Especial da Câmara e o Simpósio Internacional promovido pelo IRIA como espaços estratégicos para esse debate. Foto: Arquivo Pessoal.

IA sob Controle? Lições Globais que o Brasil Precisa Ouvir Por Marcelo Senise Enquanto o mundo avança com legislações específicas para Inteligência Artificial, o Brasil se mobiliza com apoio internacional para construir um marco regulatório que proteja a democracia e estimule a inovação. A Inteligência Artificial deixou de ser promessa futurista para se consolidar como uma força presente, moldando profundamente o trabalho, a educação, a economia, a política e, principalmente, a democracia.

A velocidade de evolução dessa tecnologia ultrapassa a capacidade de resposta das instituições. Por isso, regular a IA é uma necessidade urgente — e global. Diversos países já iniciaram a construção de seus marcos regulatórios, cada um à sua maneira. A União Europeia, por exemplo, está na vanguarda com o AI Act, um conjunto de normas que classifica sistemas de IA conforme seu nível de risco.

Tecnologias como reconhecimento facial, decisões judiciais automatizadas e monitoramento social são alvo de restrições mais severas por seus impactos sobre direitos fundamentais. O Canadá propôs a Artificial Intelligence and Data Act (AIDA), que enfatiza a transparência e a responsabilidade corporativa. As empresas são obrigadas a gerenciar riscos e garantir que seus sistemas não causem dano injustificável à sociedade ou ao indivíduo.

Já os Estados Unidos adotam uma abordagem mais descentralizada, com legislações estaduais, diretrizes presidenciais e ações de agências como o NIST e a FTC, refletindo a complexidade e o dinamismo do seu ecossistema tecnológico. A China, por outro lado, estabeleceu um controle rígido sobre o uso da IA. Exige avaliações estatais prévias antes do lançamento público de sistemas generativos e obriga que seus algoritmos reflitam os “valores socialistas”. A legislação chinesa também trata da soberania digital com rigidez: dados sensíveis não podem ser transferidos livremente para fora do país, e o Estado centraliza o controle das infraestruturas digitais estratégicas. No Reino Unido, o enfoque está na flexibilidade.

O país aposta em uma estratégia pró-inovação, evitando regulações pesadas no estágio inicial. O governo criou o AI Safety Institute, que atua na avaliação de riscos e segurança dos modelos mais avançados, ao mesmo tempo em que remove barreiras ao desenvolvimento de infraestrutura tecnológica — como centros de dados. Esses modelos demonstram que não há uma fórmula universal.

Cada país escolhe caminhos de acordo com seu contexto jurídico, político e social. No entanto, todos compartilham uma convicção: não regular é o maior dos riscos. É nesse espírito que o Brasil precisa agir. A experiência internacional nos oferece uma biblioteca viva de acertos e erros. Aprender com esses exemplos é essencial para evitarmos armadilhas comuns — seja a armadilha do excesso burocrático, que sufoca a inovação, seja a da omissão, que coloca a sociedade à mercê do caos informacional e da manipulação algorítmica.

Nesse cenário, destaca-se a enorme responsabilidade que recai sobre os ombros da Presidente da Comissão Especial para Regulamentação da Inteligência Artificial, deputada Luíza Canziani, e do Relator, deputado Eduardo Bismarck. Ambos foram escolhidos para essa missão pelo Presidente da Câmara dos Deputados, deputado Hugo Motta, que lhes confiou a tarefa de liderar um processo legislativo que seja, ao mesmo tempo, técnico, democrático e visionário. Cabe a eles o desafio de harmonizar interesses diversos — do setor produtivo à academia, da proteção de direitos individuais à promoção da inovação — e transformar essa complexidade em um texto legal que posicione o Brasil de forma soberana e estratégica na era da inteligência artificial.

Com o objetivo de trazer essas reflexões para o centro do debate legislativo brasileiro, o IRIA – Instituto Brasileiro para a Regulamentação da Inteligência Artificial promoverá, em 9 de julho, um Simpósio Internacional sobre Inteligência Artificial e Democracia, na Câmara dos Deputados. Especialistas nacionais e internacionais, pesquisadores, juristas, cientistas e representantes da sociedade civil estarão presentes para contribuir com a Comissão Especial da Câmara que discute o marco legal da IA no Brasil.

Esse evento é mais do que um debate técnico: é uma convocação para proteger os fundamentos democráticos em uma era de disrupção digital. A IA está moldando a maneira como nos informamos, decidimos e interagimos. Ela pode servir ao bem público ou ser instrumentalizada por interesses obscuros.

O que vai determinar esse rumo é, em grande parte, o que decidirmos agora — e como regularemos essa tecnologia. Temos a chance histórica de liderar um modelo de regulação que reflita nossos valores, proteja nossos cidadãos e fortaleça nossa democracia. Para isso, é fundamental ouvir o mundo. E, mais importante ainda, é aprender com ele para construir um caminho verdadeiramente brasileiro, ético e estratégico.


Marcelo Senise – Presidente do IRIA – Instituto Brasileiro para a Regulamentação da Inteligência Artificial.

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