

Dois homens são condenados por tortura em clínica no Sul de SC- Foto: Governo de Santa Catarina/Divulgação/ND
A atuação do MPSC (Ministério Público de Santa Catarina), por meio da 4ª Promotoria de Justiça de Tubarão, resultou na condenação de dois homens pelos crimes de tortura, sequestro e cárcere privado, praticados em uma comunidade terapêutica com unidades em Pedras Grande e Tubarão, no Sul de Santa Catarina.
A sentença foi proferida na última sexta-feira (2), pelo juiz da 2ª Vara Criminal da comarca de Tubarão, Fabiano Antunes da Silva. Os crimes ocorreram entre os anos de 2011 e 2016 em uma comunidade terapêutica fundada em 2010.
Homens são condenados por tortura em clínica no Sul de SC
O coordenador da instituição foi condenado à pena de seis anos de reclusão, em regime inicialmente semiaberto. Já o proprietário do local deverá cumprir 12 anos de reclusão, em regime inicialmente fechado.
Os dois réus foram condenados pelos crimes de violência física e psicológica, retirada forçada de pacientes de suas residências, administração de medicamentos sem prescrição médica e a manutenção das vítimas em situação de privação ilegal de liberdade.
“A sentença reafirma que nenhuma forma de tratamento para dependência química pode ser feita à margem da lei ou baseada na violência. A internação contra a vontade do paciente, sem respaldo legal, é crime e configura grave violação de direitos”, afirma o promotor de Justiça Rodrigo Silveira de Souza, que atuou no processo.
Como ocorriam os crimes
As famílias interessadas na internação dos parentes faziam contato com o proprietário do local. Com a autorização da família, uma equipe de funcionários da clínica era mobilizada para realizar o chamado “resgate”.
Essa ação consistia na retirada forçada do paciente de sua residência, contra vontade, mediante o uso de força física, sendo ele colocado em um veículo e conduzido até a unidade.

Homens são condenados por tortura em clínica no Sul de SC; Agressores internava os pacientes de maneira forçada – Foto: Freepick/ND
Durante o trajeto até a clínica, os pacientes, em diversas ocasiões, eram submetidos a intenso sofrimento físico e mental, por meio de agressões verbais, socos, chutes, choques elétricos, uso de algemas e outras formas de violência, práticas completamente ilegais e não baseadas por qualquer legislação e autorização judicial.
Ao chegarem na instituição, os internos recebiam uma combinação de medicamentos apelidada de “batiguti”, sem qualquer avaliação ou prescrição médica.
Dopados, eram levados a um cômodo conhecido como “Toca”, onde permaneciam isolados por dias, sendo submetidos a agressões físicas, psicológicas e medicação forçada, além de terem que realizar suas necessidades fisiológicas em baldes.
A liberação do interno da “Toca” era dependente, de forma autoritária, à autorização do proprietário ou dos coordenadores. Após a saída, o paciente passava a conviver com os demais internos e a participar das atividades da comunidade terapêutica. No entanto, o quarto também era utilizado como forma de punição para os internos que não cumpriam ordens e regras impostas.

Homens são condenados por tortura em clínica no Sul de SC; mantinham as vítimas em cárcere privado – Foto: Freepick/ND
Durante todo o período em que permaneciam na instituição contra a própria vontade, os internos eram mantidos em cárcere privado, com a liberdade pessoal violada pelo proprietário da unidade.
A sentença teve como base os relatos de ao menos duas vítimas, que afirmaram ter sido sequestradas e submetidas aos tratamentos cruéis praticados no local. As provas colhidas durante a investigação confirmaram os métodos de violações cometidos na instituição.
Fiscalizações frequentes
O local continua em funcionamento e é regularmente fiscalizado pelo MPSC, a fim de impedir o retorno de práticas ilegais. Em abril, a 4ª Promotoria de Justiça de Tubarão expediu uma recomendação, acatada pela comunidade, que determina uma série de adequações.
Entre elas, destaca-se a proibição do recebimento de internos contra a própria vontade, o respeito ao limite máximo de ocupação da estrutura, a adoção de medidas de segurança, e a proibição de castigos físicos, psíquicos e morais, entre outras exigências.

Homens são condenados por tortura em clínica no Sul de SC; MPSC faz fiscalizações frequentes na instituição – Foto: Reprodução/Freepik/ND
“O tratamento de pessoas com dependência química em Comunidades Terapêuticas deve ser voluntário, respeitoso e fundamentado em critérios técnicos, com acompanhamento médico e psicológico”, ressalta o promotor.
Além disso, há uma sentença já transitada em julgado, favorável ao MPSC, que proíbe o local de realizar internações involuntárias, permitindo apenas o acolhimento de pacientes de forma voluntária.