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Você já percebeu que alguns dos maiores erros em investimentos têm raízes em comportamentos desenvolvidos há milhares de anos? Pois é – muitos desses padrões, tão úteis para garantir nossa sobrevivência na pré-história, hoje podem se transformar em verdadeiras armadilhas psicológicas quando se trata do seu dinheiro.
O problema é que esses instintos ainda estão fortemente enraizados: continuamos agindo de forma muito parecida com nossos antepassados caçadores-coletores. Aquilo que era vital para sobreviver na selva, hoje pode ser extremamente prejudicial para quem quer investir bem. E, veja: tanto profissionais quanto investidores de primeira viagem estão sujeitos a essas armadilhas mentais!
A boa notícia é que as finanças comportamentais surgiram justamente para entender e driblar esses erros, revelando como a nossa mente pode nos enganar — e, mais importante: como evitar cair nessas ciladas.
O que são finanças comportamentais?
Finanças comportamentais são um campo de pesquisa em finanças que analisa a psicologia dos investimentos.
Em um mundo financeiro ideal, investidores totalmente racionais (“homo economicus”) seriam capazes de classificar todas as informações do mercado sem erro e tirar conclusões puramente lógicas. Na prática, porém, investidores agem de forma irracional, avaliam certas informações como mais ou menos importantes do que realmente são e, por isso, tomam decisões erradas de investimento.
As finanças comportamentais dedicam-se a estudar por que isso ocorre – e por que a repetição dessas decisões leva a desenvolvimentos aparentemente ilógicos nos mercados, e a explicação envolve o fato de estarmos todos sujeitos a vieses cognitivos.
O que são vieses cognitivos
Vieses são distorções que influenciam nossas escolhas em várias áreas da vida, e especificamente nas decisões envolvendo dinheiro, podem conduzir a comportamentos irracionais em nossas finanças.
Atualmente a ciência comportamental já tem catalogados mais de 180 vieses cognitivos, contudo, selecionei aqui 8 deles que considero especialmente importantes quando o assunto é nossa relação com o uso racional do dinheiro e a escolha de investimentos.
1) Efeito do cisne negro
Este é o erro do “Quem poderia prever?”, subestimando ou negligenciando a possibilidade de eventos raros com forte potencial para mudar cenários.
Segundo Nassim Taleb, autor do best-seller A lógica do Cisne Negro, trata-se de um evento imprevisível, com enorme impacto em nossas vidas — podendo ser positivo ou negativo.
A crise do coronavírus, por exemplo, trouxe cisnes negros positivos e negativos. No lado negativo, forçou o fechamento de restaurantes, academias e outros estabelecimentos — muitas vezes com graves consequências financeiras para proprietários e funcionários. Por outro lado, impactou positivamente investidores que ampliaram posições em ativos de qualidade que estavam temporariamente sub precificados.
A lição aqui é: invista baseando-se em suas metas e nos fundamentos dos ativos, diversifique sua carteira de forma estratégica e mantenha a calma durante turbulências do mercado. Isso não irá blindá-lo quanto a quedas e perdas momentâneas, mas, no longo prazo, uma alocação consistente evitará perdas totais e, a depender do contexto, pode até mesmo trazer algumas oportunidades relevantes.
2) Viés de sobrevivência
Esse erro nos faz superestimar a probabilidade de sucesso. Ocorre especialmente com fundos de investimento ativos. Publicações financeiras divulgam rankings dos “melhores” fundos de seus clientes anunciantes — ótimo para o marketing do setor, que se aproveita dessas “boas notícias”.
Mas qual o problema? O período de análise costuma ser curto. Superar o índice em 1, 2 ou 3 anos não é feito extraordinário. No longo prazo, poucos fundos ativos conseguem isso, descontando custos. E o cerne do viés: a maioria dos fundos acaba fechada por maus desempenhos e some do mercado e da lembrança dos investidores. Só os vencedores permanecem nas propagandas.
Esse viés leva a acreditar que fundos vencedores são comuns, quando, na verdade, a grande maioria tem relação risco/retorno desfavorável. Ou seja, numa janela longa de dez anos ou mais, após custos, não superam o índice ou um ETF.
Sendo assim, não se deixe impressionar por histórias de sucesso. Avalie sempre o retorno ajustado ao risco, descontados todos os custos, em relação ao índice de referência. Se não conseguir superar o mercado, compre um ETF.
3) Viés de confirmação
No livro A arte de pensar claramente, de Rolf Dobelli, ele refere-se ao viés de confirmação como “pai de todos os erros de pensamento”, pois tendemos a interpretar novas informações de modo que confirmem nossas crenças e teorias, ignorando dados que possam refutá-las.
Esse viés nos impede de avaliar criticamente decisões de investimento e abandonar estratégias perdedoras, perpetuando decisões ruins.
4) Ignorância da regressão à média
A ignorância da regressão à média ocorre quando investidores não reconhecem que resultados extraordinários – sejam eles positivos ou negativos – tendem, com o passar do tempo, a retornar para níveis mais próximos da média histórica.
Esse viés leva muitas pessoas a acreditar que desempenhos excepcionais irão se repetir indefinidamente, o que fomenta o comportamento de perseguir “modas” ou “ganhadores recentes” do mercado em busca de retornos acima da média. Na prática, esse comportamento frequentemente resulta em frustrações e perdas.
O psicólogo Daniel Kahneman, vencedor do Prêmio Nobel de Economia, discute esse conceito em seu livro Rápido e Devagar: duas formas de pensar. Ele mostra como nosso cérebro dá mais peso a eventos recentes ou extraordinários, negligenciando o poder das estatísticas e das médias no longo prazo.
Imagine um fundo de ações que teve um desempenho excepcionalmente bom nos últimos dois anos, superando amplamente o mercado. Muitos investidores, observando esses resultados, decidem aportar recursos nesse fundo, esperando que o padrão de ganhos continue.
No entanto, dada a regressão à média, é muito provável que tal desempenho seja suavizado nos anos seguintes, fazendo com que o retorno se aproxime da média dos demais fundos – ou até fique abaixo dela. Esse fenômeno explica por que poucos fundos “campeões” continuam a superar seus pares de forma consistente ao longo do tempo.
Por isso, antes de investir com base em uma performance recente muito acima da média, é fundamental considerar se esse desempenho é sustentável ou apenas fruto de variabilidade estatística momentânea. Como ensina Kahneman: “Desempenhos extremamente altos ou baixos são, em parte, devidos à sorte – e a sorte, por definição, não é constante”.
5) Comportamento de manada
É a propensão de seguir a multidão sem analisar racionalmente e de forma individual o cenário. No passado, esse comportamento foi fundamental para a sobrevivência dos nossos ancestrais. Em ambientes hostis, seguir a maioria podia significar escapar de predadores rapidamente ou encontrar recursos essenciais, como água e comida.
No mercado financeiro, esse instinto pode ser problemático. Muitos investidores tomam decisões baseadas no que a maioria está fazendo, ignorando evidências objetivas. Isso pode gerar bolhas — quando os preços dos ativos sobem de forma irracional — e pânicos — quando todos tentam vender ao mesmo tempo.
6) Aversão à perda
Fenômeno onde as perdas têm um impacto emocional maior do que ganhos de valor equivalente, levando a comportamentos excessivamente conservadores ou à relutância em admitir prejuízos.Isso pode nos levar a evitar riscos mesmo quando eles são racionalmente justificáveis.
Um exemplo muito ilustrativo da aversão à perda é o fato de termos no Brasil um número de investidores em caderneta de poupança quase 17 vezes maior do que investidores em bolsa de valores.
De acordo com dados do Banco Central e da B3, atualmente temos 89 milhões de CPFs em poupança, totalizando um montante de aproximadamente R$ 1,07 tri, enquanto em bolsa de valores temos algo em torno de 5,2 milhões de CPFs, totalizando R$ 587 bi em aplicações financeiras.
Considerando que historicamente a poupança perde para a inflação, é uma escolha desprovida de critério e racionalidade, demonstrando o longo caminho que a educação financeira ainda precisa trilhar para romper esse conservadorismo histórico.
7) Excesso de confiança
Tendência a superestimar o próprio conhecimento, habilidade ou capacidade de prever eventos futuros, levando a decisões de investimento excessivamente otimistas ou arriscadas. Isso é facilitado por sucessos iniciais acidentais, a famosa “sorte de principiante”.
Exemplo: nos anos 2000, no boom das empresas pontocom, muitos achavam que eram ótimos investidores por terem acertado apostas, sem perceber que o mercado todo estava subindo. Quando a bolha estourou, muitos perderam muito dinheiro.
Surpreendentemente, até especialistas são suscetíveis a esse viés, e o erro é multiplicado quando seguimos cegamente recomendações de figuras supostamente com autoridade (“viés de autoridade”).
Minha sugestão é que você desconfie de previsões, inclusive as suas e as dos analistas do mercado. Invista com base em fundamentos, com base em expectativas reais de crescimento econômico global a longo prazo.
8) Falácia do custo irrecuperável
Esse é um erro clássico no mundo dos investimentos. Trata-se da inclinação a persistir em um investimento ou projeto ruim apenas porque já foram investidos recursos (tempo, dinheiro, esforço). O racional seria considerar apenas o custo-benefício futuro, pois custos passados não podem ser recuperados e, portanto, não deveriam influenciar decisões futuras.
Um exemplo é quando você mantém um fundo caro, mesmo sabendo que ele perde para o índice, apenas porque já “gastou muito com ele”. O certo é cortar as perdas e trocar por um fundo melhor.
Como evitar as armadilhas psicológicas nos investimentos?
Reconhecer que todos nós somos vulneráveis a vieses é o primeiro passo para decisões mais inteligentes. Pratique o olhar crítico, mantenha disciplina na execução da sua estratégia, busque informação, diversifique seus investimentos e não tome decisões impulsivas. Com o tempo, é possível “domar” esses instintos ancestrais e construir uma relação mais saudável — e lucrativa — com o seu dinheiro. Lembre-se: investir bem é, acima de tudo, um exercício de autoconhecimento e paciência.
Eduardo Mira é investidor profissional, analista CNPI, mestrando em Economia, com MBAs em Gestão de Investimentos, Análise de Investimentos e Educação Financeira, empresário, sócio do Clube FII, Grana Capital e sócio fundador da holding financeira MR4 Participações.
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