As redes sociais são apenas um sintoma

Nunca estivemos tão interligados e, ao mesmo tempo, tão distantes da real compreensão do que significa estar conectado. As redes sociais são apenas um sintoma. O fenômeno é mais profundo, mais estrutural e, ao longo da história, sempre existiu de maneira subjacente às grandes mudanças.

Por séculos, o poder foi associado à hierarquia. Reis, imperadores, generais, presidentes. A ascensão e a queda dos impérios foram contadas a partir do topo da pirâmide. O organograma do mundo era rígido e vertical. O poder fluía de cima para baixo, como uma cascata cujas margens eram bem delimitadas.

Mas o que acontece quando a lógica da pirâmide é desafiada pela horizontalidade? Quando o poder, em vez de concentrado, se espalha por nós invisíveis que interagem, compartilham e, às vezes, subvertem? Este não é um fenômeno novo, mas sua intensidade atual sugere que estamos em um desses raros momentos da história em que a praça desafia a torre, em que a rede se sobrepõe à hierarquia.

A pergunta essencial não é se o mundo é governado por hierarquias ou redes. Ambas coexistem e disputam espaço ao longo do tempo. A questão central é: em qual delas o poder, hoje, tem mais peso? E qual delas compreendemos melhor?

Para quem ocupa uma posição na hierarquia, as redes podem parecer um ruído incômodo. Grupos que operam fora da estrutura formal, influências difíceis de mapear, conexões que escapam ao controle burocrático. O grande erro dos historiadores clássicos foi ignorar o papel das redes. O grande erro dos conspiracionistas modernos é superestimá-las.

As teorias da conspiração, sempre sedutoras, partem de um princípio reducionista: há uma única rede secreta puxando os fios do mundo. Banqueiros, elites, sociedades discretas — uma entidade oculta que governa das sombras. Mas a realidade é mais caótica. O mundo não é dominado por uma única rede onipotente, mas por múltiplas redes, que se cruzam, se chocam, se fundem e se dissolvem. Quem já trabalhou dentro de uma grande organização sabe que o poder real muitas vezes se esconde nas relações informais, na troca de mensagens paralelas, na influência sutil dos jantares privados e dos grupos de afinidade que não aparecem no papel timbrado.

Hoje, mesmo as instituições mais rígidas, como governos e corporações, são forçadas a navegar nesse jogo de redes. O organograma oficial é um artefato; o poder real transita nos circuitos invisíveis dos relacionamentos. Não se trata apenas de networking no sentido superficial do termo, mas da compreensão de que as grandes decisões raramente seguem o caminho linear previsto nos manuais de governança.

O século XXI não inventou as redes, mas as potencializou como nunca antes. A revolução digital criou a ilusão de que todo indivíduo tem o mesmo acesso e peso na balança do poder. Mas a verdade é que nem todas as conexões são iguais. Algumas redes têm uma densidade de influência maior do que outras, e saber onde se posicionar nesse tabuleiro é mais relevante do que simplesmente estar conectado.

Se vivemos em um momento de transição entre uma estrutura de poder vertical para outra mais horizontal, isso não significa que o passado seja irrelevante. Muito pelo contrário. As redes sempre existiram, mas nem sempre foram reconhecidas. A grande ironia é que, enquanto antes eram invisíveis porque desprezadas, hoje são invisíveis porque banalizadas.

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