Transação tributária no âmbito dos estados: consolidação normativa e caminhos de expansão

Por Gabriela Bittencourt Zanella e Ricardo Anderle, advogados e sócios do Núcleo Tributário e Aduaneiro da Menezes Niebuhr.

Desde a edição da Lei nº 13.988/2020, a transação tributária consolidou-se como importante instrumento de gestão da dívida ativa da União. A normatização federal, somada ao avanço institucional da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), possibilitou a construção de políticas públicas voltadas à resolução consensual de litígios tributários, com ganhos de eficiência, previsibilidade e justiça fiscal.

Naturalmente, o debate se expandiu para os entes subnacionais.

No plano estadual, a transação tributária tem ganhado relevância prática e normativa. Alguns estados avançaram de forma pioneira, como São Paulo, Rio Grande do Sul e Mato Grosso, estabelecendo regras próprias para a composição de créditos inscritos em dívida ativa. Outros, como Ceará, Minas Gerais e Pernambuco, seguiram caminhos semelhantes, ainda que com particularidades de desenho e abrangência.

Um marco relevante para a expansão da transação no contexto estadual foi a publicação do Convênio ICMS nº 210/2023. Celebrado no âmbito do Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ), o instrumento conferiu segurança jurídica aos estados para instituírem programas de transação envolvendo créditos de ICMS — tributo que, até então, suscitava debates sobre a possibilidade de concessões em razão da Lei Complementar nº 24/1975.

Com base no Convênio nº 210/2023, abriu-se a oportunidade para que as unidades federadas estruturassem seus próprios modelos de transação tributária. A partir disso, caberia a cada estado avaliar a viabilidade normativa e institucional de implementar soluções específicas para créditos considerados de difícil recuperação ou cuja discussão jurídica comprometa a eficiência da cobrança.

Os resultados observados nos estados que já regulamentaram a matéria indicam benefícios relevantes: incremento de arrecadação com foco na liquidação de passivos inativos, estímulo à regularização fiscal voluntária, racionalização do contencioso tributário e modernização da cobrança. Além disso, constata-se uma melhora na relação entre Fisco e contribuinte, pautada por critérios objetivos e maior transparência.

A adoção de programas de transação tributária voltados à regularização de débitos representa uma estratégia inovadora de política fiscal, com grande potencial para estimular a retomada econômica e fortalecer o ambiente de negócios.

Dados recentes divulgados pela PGFN confirmam esse potencial: mais da metade do valor recuperado em 2024, acima de R$ 34 bilhões em dívidas tributárias, foi obtido via soluções de consensualidade, denotando a efetividade do modelo tanto para o contribuinte quanto para o Estado. No plano estadual, programas de transação em São Paulo, por exemplo, resultaram na negociação de R$ 44,2 bilhões de ICMS inscritos na dívida ativa paulista.

É importante observar que a transação, diferentemente de programas tradicionais de parcelamento ou remissão, está condicionada a critérios legais e técnicos. O artigo 171 do Código Tributário Nacional exige que a proposta envolva concessões recíprocas e esteja alinhada ao interesse público. Da mesma forma, os parâmetros fixados pela legislação federal e replicados em normas estaduais — como análise da recuperabilidade do crédito, capacidade de pagamento e risco jurídico — reforçam o caráter técnico da medida.

Por isso, a implementação da transação tributária no contexto estadual exige não apenas vontade normativa, mas também estruturação institucional. Envolve a atuação coordenada entre as procuradorias estaduais, as secretarias da fazenda e os órgãos de controle. Também exige critérios transparentes, segurança jurídica e mecanismos de monitoramento que garantam a efetividade dos acordos celebrados.

A transação tributária é, portanto, uma ferramenta que combina responsabilidade fiscal, inteligência arrecadatória e modernização da gestão pública. Sua expansão no âmbito dos estados representa um passo importante para o amadurecimento da política fiscal brasileira, especialmente diante do contexto de reformas e da busca por equilíbrio nas contas públicas com preservação da atividade econômica.

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