Fotógrafo Sebastião Salgado Retrata a Alma do Mundo em Preto e Branco

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Poucos fotógrafos mudaram tanto a forma como o mundo é visto quanto Sebastião Salgado. Há mais de 50 anos, o fotógrafo documental brasileiro registra algumas das histórias mais impactantes do nosso tempo: refugiados fugindo de conflitos, trabalhadores submetidos a esforços físicos extremos, comunidades indígenas à margem da modernidade e paisagens remotas ainda não afetadas pela industrialização. Sempre trabalhando em preto e branco, suas imagens combinam escala ampla e intimidade, reunindo humanidade crua e uma sensação atemporal de lugar.

Formado em economia antes de se dedicar à fotografia no fim da juventude, Salgado aborda seus temas com empatia e paciência, frequentemente passando anos imerso em um único projeto. Ao fotografar a fome na África, garimpeiros no Brasil, as Galápagos, calotas polares ou a floresta amazônica, sua proposta vai além do registro: é um convite à observação prolongada, à reflexão profunda e à reconsideração do papel humano no planeta. Suas fotografias são ensaios visuais, reflexões sobre a fragilidade e a resistência da vida, e também alertas apresentados por meio de composições marcantes.

Seu trabalho está em destaque no centro Les Franciscaines, na comuna francesa de Deauville, em uma mostra aberta ao público até 1º de junho de 2025, organizada em colaboração com a Maison Européenne de la Photographie,que possui mais de 400 obras suas no acervo.

A Forbes conversou com Sebastião Salgado sobre a exposição e momentos-chave de sua carreira. Confira os destaques do papo:

Como descrever a atual exposição no Les Franciscaines?

Quando chegamos lá, fizemos um passeio pela exposição. E, para mim, foi como fazer um passeio pela minha própria vida. Eu tive o privilégio — porque é um privilégio — de ter podido ir a todos esses lugares. Às vezes, as pessoas me dizem: “Sebastião, você é um artista.” E eu respondo: “Não, sou fotógrafo.” Porque só os fotógrafos têm o direito de duvidar. Quando vamos a todas essas regiões do mundo, enfrentando todos os problemas e desafios que você pode imaginar, nos perguntamos: sobre ética, legitimidade, segurança. E cabe a nós encontrar a resposta, sozinhos.

Quantas vezes na minha vida eu pus a câmera de lado e sentei para chorar? Porque era dramático demais, e eu estava sozinho. Esse é o poder do fotógrafo: poder estar lá. Porque um jornalista pode obter informações de um lado ou de outro, montar um sistema que vai trazer a informação correta, mas ele não precisa estar presente. Um fotógrafo, se não estiver lá, não tem a imagem. Ele precisa ir até lá. A gente se expõe muito. Por isso, é um privilégio imenso. E, ao caminhar pela exposição, observando um pouco, é impressionante como viajei de volta no tempo, pela minha própria vida.

Sebastião Salgado

Sebastião Salgado, Chinstrap Penguins on an Iceberg, Ilhas Sandwich do Sul, 2009, Colecção MEP, Paris

Como foi, física e emocionalmente, a experiência de documentar os incêndios nos campos de petróleo no Kuwait?

Foi a maior poluição que este planeta já teve – 600 poços de petróleo queimando ao mesmo tempo. Houve dias e mais dias em que não víamos o sol. Era noite 24 horas por dia. E foi impressionante porque, em certo momento, uma rajada de vento abriu as nuvens e um raio de sol entrou. Era como trabalhar em um teatro do tamanho do planeta. Os gases explodiam acima de nós, e o medo de ser queimado vivo estava sempre presente. O som dos poços de petróleo, a pressão saindo do solo, era como trabalhar atrás de uma turbina a jato. Hoje sou meio surdo, mas o importante é que as fotos estão lá.

Qual foi sua reação emocional ao testemunhar o genocídio em Ruanda?

Cheguei a um campo de refugiados e vi 15 mil, 20 mil pessoas morrerem todos os dias. Já não era mais possível enterrá-las uma a uma. Era preciso usar escavadeiras para abrir buracos enormes e despejar 20 ou 30 corpos de uma vez. Foi tão brutal que fiquei doente – realmente doente. Tive vergonha de ser fotógrafo. Tive vergonha de fazer parte da espécie humana, porque até então, eu só havia fotografado uma espécie: a nossa.

Sebastião Salgado

Sebastião Salgado, Coal Miners, Dhanbad, Estado de Bihar, Índia, 1989, Colecção MEP, Paris

Como você e sua esposa Lélia iniciaram o vasto projeto de reflorestamento Instituto Terra, e o que isso significou para você pessoalmente?

Não éramos ecologistas. Queríamos simplesmente plantar uma floresta. Mas, à medida que plantávamos, vimos a vida voltar: folhas, flores, insetos, pássaros, mamíferos. E, pouco a pouco, minha esperança renasceu. Não baseada nos seres humanos, mas em todas as outras espécies do planeta. Em algum momento, descobrimos que éramos ecologistas, porque tudo o que fazemos é pura ecologia. Plantamos todo o espaço, é uma floresta magnífica. Possivelmente, nos próximos 10 anos – espero ainda estar vivo – teremos plantado pelo menos mais 10 milhões de árvores. É o maior projeto ecológico do Brasil hoje.

Como esse renascimento influenciou seu trabalho em “Gênesis” e sua visão do planeta?

Concebemos uma série de viagens, ao longo de oito anos, para fotografar as partes intocadas do planeta – as partes ainda não destruídas. No início, não sabíamos que isso se chamaria “Gênesis”, mas essas jornadas se tornaram “Gênesis”. E eu descobri que as maiores viagens que fiz na vida foram dentro de mim mesmo. O planeta tem uma sabedoria colossal. Não sou religioso, mas acredito na evolução. É uma pena vivermos apenas 80 ou 90 anos no máximo. Se pudéssemos viver mil anos, seríamos capazes de entender nosso planeta mil vezes melhor, e viver de outra forma.

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