A conta que não fecha: Governo Lula compra desgastes que não lhe pertencem

Muito se discute sobre a comunicação do governo federal, mas insisto: o problema não está apenas na forma, mas na essência. Nada pesa mais contra o governo hoje do que a agenda que ele escolhe – ou pior, a que ele compra sem precisar. São pautas que geram desgaste desproporcional à relevância do tema e, muitas vezes, sequer são de origem direta do governo federal.

O exemplo mais emblemático dos últimos tempos foi a famigerada “taxa da blusinha”. Em agosto passado, o governo elevou para 20% a alíquota sobre encomendas internacionais de até 50 dólares, um ajuste que, na prática, alinhou-se a um movimento mais amplo, incluindo o aumento do ICMS estadual, que subirá de 17% para 20% em abril. O objetivo? Arrecadar mais e, em tese, proteger o varejo nacional. O resultado, no entanto, foi uma tempestade de desgaste político.

Os números revelam o paradoxo. Em 2024, o volume de encomendas caiu 11% em relação a 2023, passando de 209,58 milhões para 187,12 milhões de mercadorias importadas. O programa Remessa Conforme, que facilita e formaliza esse tipo de transação representou 91,5% das importações. E no fim das contas, a arrecadação cresceu R$1 bilhão, indo de R$1,98 bilhões para R$2,98 bilhões.

Mas será que essa cifra justifica o desgaste sofrido? A resposta parece óbvia: não. Em um universo de centenas de bilhões movimentados pelo governo, um bilhão a mais não é nada perto da pancadaria reputacional gerada.

O mais curioso desse episódio é que essa taxação não foi uma invenção exclusiva do governo federal. Ela foi impulsionada por pressões do varejo nacional, que há tempos luta contra a concorrência das gigantes asiáticas. No entanto, a narrativa pública transformou a pauta em um ônus exclusivamente do Planalto, com uma associação direta – e injusta – à primeira-dama Janja. De repente, o tema se tornou um símbolo de insensibilidade do governo com o consumidor, um prato cheio para críticas em redes sociais e ataques da oposição.

Essa dinâmica se repete em outras áreas: o governo muitas vezes herda desgastes que não são seus, enquanto os benefícios se diluem entre múltiplos atores. E pior, ignora que, em um ambiente de comunicação polarizado e amplificado pelas redes, os danos são exponenciais.

A lição que fica é clara: não basta apenas melhorar a comunicação – é preciso escolher melhor as batalhas. E, principalmente, entender que algumas pautas trazem mais prejuízo político do que benefício fiscal. No fim das contas, há desgastes que simplesmente não valem a pena comprar.

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