Como a Agricultura Regenerativa se Tornou Um “Must-do” para a Indústria Vinícola Global

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As práticas da agricultura regenerativa podem tornar vinhedos mais saudáveis

A Moët Hennessy, divisão de vinhos e destilados do grupo francês de luxo LVMH (Louis Vuitton Moët Hennessy), controlada pelo bilionário Bernard Arnault, criou um projeto que vem dando frutos. O mais recente, o World Living Soils Forum (Fórum Mundial dos Solos Vivos), aconteceu na primeira quinzena de outubro. A Moët Hennessy é dona de marcas icônicas, como os champagnes Moët & Chandon, Dom Pérignon e Veuve Clicquot, além de vinhos como Château d’Yquem, Cheval Blanc e Terrazas de los Andes. A primeira edição ocorreu em 2022.

“Must-do” pode ser traduzido como “obrigatório”, “imperdível” ou “essencial”. É exatamente sobre esse conceito que a Moët Hennessy tem se dedicado para a preservação dos solos vivos de seus vinhedos, e o evento serve para ligá-lo à ciência. Ele aconteceu em Arles, na França, onde reuniu 500 participantes. Outros 100 participaram de dois eventos simultâneos e online, um na China e outro nos Estados Unidos. Nesse caso, em Napa Valley, na Califórnia, principal produtora da bebida naquele país. Especialistas em agricultura regenerativa falaram sobre suas pesquisas e estudos nesse campo e discutiram como a indústria do vinho pode se beneficiar com a adoção da prática.

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Segundo a Regeneration International, organização ligada à também norte-americana Organic Consumers Association, que promove a agricultura regenerativa, ela é um tipo de manejo baseado em práticas agrícolas e de pastoreio que, entre outros benefícios, podem reverter os efeitos das mudanças climáticas ao reconstruir a matéria orgânica do solo e restaurar a sua biodiversidade. O evento da Moët Hennessy contou com 180 palestrantes e foi estruturado em 4 trilhas destacando os principais desafios enfrentados para apoiar a transição agrícola e vitivinícola.

David Pearson, CEO da Joseph Phelps Vineyards, em St. Helena, no Napa Valley, foi o moderador de uma das conversas. A vinícola Phelps, fundada em 1973, tem sido, por décadas, uma das melhores produtoras da região, mais famosa pelo icônico vinho Joseph Phelps Insignia, desenvolvido nos EUA, com uma criteriosa seleção das uvas Cabernet Sauvignon. Há alguns anos, a Moët Hennessy comprou a vinícola, e hoje a Phelps continua seu legado como uma das propriedades mais elegantes e respeitadas do Napa Valley.

De acordo com o executivo, a vinícola é uma das líderes em agricultura regenerativa na região. A isso Pearson atribui a pastagem de ovelhas em suas vinhas, que atuam como uma espécie de fertilizante natural. E mais, ao se alimentarem de ervas, que são daninhas para os vinhedos, se reduz a necessidade de produtos químicos.

Mark J.Sebastian

David Pearson é presidente da vinícola Joseph Phelps, em Napa Valley, que adota práticas regenerativas no plantio

Cristina Lazcano, professora de solo e nutrição de plantas na Universidade da Califórnia, a UC Davis, diz que “a indústria do vinho está bem posicionada para trabalhar nas grandes questões, já que há uma boa compreensão do sentido de lugar, e a conexão entre a terra, as pessoas, as culturas e o meio ambiente, e como todos eles influenciam uns aos outros”. Para ela, essas são características que não são encontradas em outras culturas e commodities.

Adam Keeper, CEO da Agrology, empresa que fornece pesquisa para agricultores e produtores, explicou que apenas na viniviticultura os consumidores fazem visitas às vinícolas para provar os frutos do trabalho, ao contrário de outros produtos. “Brincamos com nossos clientes que ninguém aparece em uma degustação de milho no Meio-Oeste dos EUA”, afirma. “Para esta indústria (vinho), os clientes realmente gostam de fazer a visita à fábrica e ver como o vinho é feito, e planejam férias inteiras em torno disso.”

Keeper acredita que esse é um grande benefício para as vinícolas na liderança do caminho para vinhedos mais saudáveis e regenerativos. “Podemos realmente aproveitar isso e usar a nosso favor, enquanto avançamos a causa da agricultura regenerativa e aproveitamos a oportunidade para repensar nossas ideias sobre para onde o movimento deve ir e garantir que o público em geral esteja seguindo na direção certa”.

Daphne Amory, consultora em agricultura regenerativa em Napa, falou sobre como os ecossistemas se entrelaçam. “Estamos começando a entender o que está abaixo da superfície agora, porque passamos muito tempo olhando apenas acima do solo,” disse ela.

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Para Anna Brittain, diretora executiva do Napa Green, programa de vinho sustentável que trabalha com vinícolas no Napa Valley, há um trabalho necessário junto aos produtores de vinho e agricultores. “Trata-se de construir sistemas agrícolas cada vez mais autossuficientes que precisam cada vez menos de intervenção humana.” Ela acredita que praticar a agricultura regenerativa é o ‘nível platina’, e que “não se trata apenas de regenerar os ecossistemas, mas também de regenerar os sistemas sociais”.

Experiências Além das Pesquisas e Academia

Um segundo bloco de palestrantes trouxe especialistas variados para tratar de solos vivos e da agricultura regenerativa. Judith Schwartz, por exemplo, é uma jornalista norte-americana que escreve sobre ciência e, mais recentemente, sobre solos. Ela questionou os motivos que levam a natureza não ter valor especialmente quando comparada à riqueza. “A comida só pode ser saudável se o solo em que é cultivada estiver saudável.” Ela também contou como é emocionante ser uma jornalista e ter pessoas que a procuram para falar sobre seu trabalho. “Os produtores querem contar suas histórias de como melhoraram seu solo”.

A virada de chave para Judith veio em 2013, quando escreveu o livro “Cows Save The Planet: and Other Improbable Ways of Restoring Soil to Heal the Earth” ou “As vacas salvam o planeta: e outras formas improváveis ​​de restaurar o solo para curar a terra”. Segundo ela, poucas pessoas naquela época falavam sobre o solo, enquanto hoje a pauta se tornou muito forte no movimento climático. “Penso na agricultura regenerativa como a melhoria do solo. Na natureza sempre há distúrbios, e quando interagimos e criamos distúrbios, pode ser um distúrbio degenerativo ou um distúrbio regenerativo”.

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Oliver English diz que se sentiu mais inspirado após conversar e entender melhor a profissão dos agricultores

Oliver English, CEO da Common Table Creative, produtora norte-americana que conta histórias sobre comida, filmes e tecnologia, falou sobre sua carreira multifacetada, de chef a cineasta, sendo um de seus filmes mais recentes, o documentário chamado “Feeding Tomorrow” (em tradução literal, “Alimentando o Amanhã”). O filme conta a história de como a comida é tratada de várias maneiras ao redor do mundo e como alguns processos precisam mudar para salvar o habitat da Terra.

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English diz que os cineastas precisam conversar mais com os agricultores sobre seu trabalho e que ficou muito inspirado pela visão deles. “Precisamos que os agricultores sejam celebridades”, afirma. Sobre o filme, ele diz que “a intenção era destacar o papel dos agricultores na sociedade, e celebrar a restauração e regeneração das quais eles estão participando, conectando todo o trabalho incrível que está sendo feito em fazendas em todo o mundo nos últimos anos”. Para English, “trata-se de compartilhar histórias com as quais as pessoas se relacionam e se conectam emocionalmente”.

Jesse Smith, diretor de Gestão de Terras da White Buffalo Land Trust, uma empresa e movimento que atua como um centro global em agricultura regenerativa, monitoramento ecológico e desenvolvimento de empreendimentos, nasceu em Santa Bárbara, na Califórnia. Mas o primeiro contato de Smith com áreas de produção de alimentos foi em uma viagem à França com sua esposa, dirigindo pelo interior do país, entre elas a região de Bordeaux. “Cada pequena cidade, cada pequena região baseada em seu vinho, pão ou queijo tinha sua própria expressão única de cultura”. Ele comparou isso com uma viagem pela Califórnia onde, em suas palavras, “de Sacramento a San Diego, havia alguma beleza, mas não havia essa singularidade sobre cada lugar”.

Smith queria ter a mesma experiência que viu na França. Então, no início da década de 2010, ele e outros amigos criaram uma fazenda chamada Regenerative Earth Farms, onde passaram a produzir queijos artesanais orgânicos, criaram porcos de raças tradicionais, gerenciaram pomares de frutas e iniciaram um jardim orgânico. Para ele, a White Buffalo faz muitas coisas, incluindo a produção de alimentos dos quais ele se orgulha. “Por meio dos nossos programas de educação e treinamento, estamos abordando e tentando aumentar o conhecimento ecológico da comunidade”.

English falou ainda sobre os resultados dos trabalhos com agricultura regenerativa. “As frutas e verduras mais saborosas vêm dos solos mais saudáveis, vêm das fazendas regenerativas mais biodiversas. “Se estamos falando de comida, vamos falar sobre sabores, de densidade nutricional, de saúde humana, e deste movimento como algo divertido. É por meio da comida que comemos, da comida que apoiamos que somos participantes na gestão do planeta”.

* Tom Hyland é colaborador da Forbes EUA. Tem 44 anos de experiência na indústria vinícola, escrevendo, nos últimos 25 anos, sobre vinhos de todo o mundo, de Napa Valley a Champagne, e praticamente todas as regiões da Itália.

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