Opinião | Investimentos, fatores emocionais e o futuro incerto da aposentadoria no Brasil

Nos últimos anos, muito tem se falado sobre a crise da Previdência no Brasil. O debate, contudo, ainda não chegou de fato às conversas informais da maioria das famílias brasileiras. Para muitos, o sistema previdenciário público continuará garantindo uma aposentadoria após décadas de trabalho árduo. A realidade, no entanto, é bem diferente. Sem uma reforma profunda, a aposentadoria pública, como a conhecemos, está com os dias contados.

O modelo atual de repartição simples, onde os trabalhadores em atividade financiam os benefícios dos aposentados, funcionou relativamente bem nas décadas passadas, quando a população era jovem e a relação entre ativos e inativos era saudável. Hoje, a situação é bem mais sombria. Dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) apontam que a proporção de 1,97 contribuinte para cada beneficiário, observada em 2022, diminuirá para 0,86 em 2060. Em 1923, quando a Previdência foi criada, o país tinha 13 pessoas em idade ativa para cada idoso; em 2016, essa proporção já era de 8,5. Os números são frios e realistas: haverá cada vez menos contribuintes para sustentar um número crescente de beneficiários.

Além disso, o déficit da Previdência Social não para de crescer. As projeções do Balanço Geral da União de 2023 indicam que, em 2024, o déficit da Seguridade Social deve alcançar R$ 326,2 bilhões (2,5% do PIB). Sem reformas, essa necessidade de financiamento pode chegar a R$ 25,5 trilhões até 2100. Sem uma reforma estrutural, esse buraco consumirá uma parcela cada vez maior do orçamento público, drenando recursos que poderiam ser investidos em áreas essenciais como saúde, educação e infraestrutura. Em última análise, será impossível sustentar o atual modelo sem sacrificar gerações futuras.

Diante desse cenário, é vital que cada cidadão assuma a responsabilidade por seu próprio futuro financeiro. O sistema público, sem mudanças drásticas, deixará de ser uma rede de segurança confiável. A expectativa de que o Estado proverá uma aposentadoria digna está cada vez mais distante, e aqueles que não se prepararem desde já enfrentarão sérias dificuldades no futuro.

Levantamento “Risco de Longevidade” realizado pela plataforma de planejamento financeiro Super Rico revelou que a maior parte dos brasileiros (63%) conta somente com uma vaga ideia do valor que precisa para a aposentadoria, e 25% não tem nem ideia de quanto deverão precisar quando saírem de seus empregos.

Apesar de diversas opções de investimento disponíveis no mercado, um estudo realizado pelo Banco Mundial mostra que somente 1% dos brasileiros consegue juntar dinheiro o bastante para viver uma aposentadoria digna. Assim, o brasileiro precisa entender que não há mágica: o dinheiro que será necessário na velhice precisa ser acumulado ao longo da vida. Contar exclusivamente com a Previdência é uma aposta furada.

Mas por que tantas pessoas relutam em começar a poupar e investir? A resposta está em um fenômeno conhecido como “desconto hiperbólico”, um viés psicológico que faz com que as pessoas valorizem mais as recompensas imediatas em detrimento de benefícios futuros. Em outras palavras, o prazer de gastar hoje fala mais alto do que a necessidade de economizar para o amanhã.

Burrhus Frederic Skinner, um dos psicólogos mais influentes do século XX, desenvolveu a teoria do condicionamento operante, que se concentra em como as consequências de um comportamento influenciam sua repetição, através do reforço positivo imediato. Skinner diferenciou entre reforço positivo e negativo, explicando porque as pessoas tendem a preferir recompensas imediatas a benefícios futuros. Essa teoria ajuda a entender o conceito de desconto hiperbólico, desenvolvido por Richard Herrnstein, psicólogo e estudioso de Skinner, cuja Lei da Correspondência explora escolhas cotidianas. Comportamentos como gastar em lazer em vez de poupar para o futuro refletem a busca por recompensas emocionais imediatas, mesmo com o custo de benefícios a longo prazo.

A teoria do desconto hiperbólico de Herrnstein sugere que o valor percebido de uma recompensa diminui de forma não linear conforme o tempo de espera, o que explica por que recompensas futuras, como a poupança para aposentadoria, são menos atrativas do que prazeres imediatos, como consumo e viagens. Isso está diretamente ligado ao problema da Previdência Social no Brasil, uma vez que muitos indivíduos priorizam gastos imediatos em vez de investir para o futuro, agravando a situação previdenciária.

A teoria do comportamento operante de Skinner complementa essa análise, ao afirmar que o comportamento humano é fortemente moldado por reforços imediatos, ou seja, as pessoas tendem a repetir ações que trazem gratificação instantânea. Herrnstein aprofunda isso com a Lei da Correspondência, mostrando que as escolhas tendem a favorecer recompensas imediatas, explicando porque poucos se preparam para o longo prazo. Assim, a preferência por gratificações imediatas dificulta a construção de uma reserva financeira para a aposentadoria, contribuindo para a crise da Previdência no Brasil, já que poucos contribuem de forma suficiente para sustentar o sistema a longo prazo.

Portanto, o modelo de repartição simples da Previdência Social brasileira, no qual os trabalhadores em atividade financiam os benefícios dos aposentados, reforça a falsa sensação de segurança para muitos, que ainda esperam uma aposentadoria estável após anos de trabalho. No entanto, o aumento da proporção de trabalhadores ativos para cada beneficiário e o crescimento constante do défice previdenciário indicam que o modelo se tornará cada vez menos sustentável sem reformas estruturais.

Ao acreditar que o sistema público suprirá as necessidades na aposentadoria é um tanto inseguro, e representa uma armadilha para as gerações futuras, e o comportamento de consumo imediato pode levar a população a consequências não apenas de ordem financeiras, mas, de ordem psicológicas, pois sua fase laboral e produtiva cairá com a chegada da idade, e em muitos casos o aparecimento de doenças que começam a surgir e a população estará sem recursos financeiros para cuidar da saúde e se manter.

O economista Paulo Tafner, um dos maiores especialistas brasileiros em Previdência diz que o sistema de capitalização é uma forma eficiente de constituição de poupança e de garantia de aposentadoria para todos, mesmo porque, será a única forma de termos um sistema de aposentadoria daqui 30 ou 40 anos.

Em resumo, a crise da Previdência no Brasil é uma bomba-relógio que está prestes a explodir. Não se pode continuar ignorando o problema; o tempo está se esgotando, e é hora de poupar, investir e assumir o controle do próprio futuro. Quem esperar que o Estado resolva essa questão sozinho corre o risco de enfrentar uma aposentadoria incerta e financeiramente insegura.

Jorge Amaro Bastos Alves e Liz Andréa Babireski Braz de Oliveira, economista e psicóloga

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