Internet: Brasil precisa vencer desigualdades no acesso para concretizar a “cidadania digital”

A parcela de usuários de Internet no Brasil com mais de 10 anos saltou de 34% para 84% da população nos últimos 15 anos. Com 180 milhões de brasileiros conectados e vidas cada vez mais digitais, os serviços públicos também se consolidam na esfera online.

Governo ainda tem desafios para garantir internet à todos

Governo ainda tem desafios para garantir internet à todos – Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

À medida em que cresce o investimento em tecnologia e digitalização do sistema de cidadania, é essencial garantir que a população esteja habilitada a usufruir desses recursos da melhor forma.

Segundo dados do Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos, 150 milhões de brasileiros estão cadastrados na plataforma GOV.BR, que centraliza as informações e serviços digitais oferecidos à população pelo governo federal.

A página de login da plataforma é a página governamental mais acessada do mundo, segundo pesquisado analista de tráfego Similar Web, com até 4 mil acessos por segundo.

Entre as 4200 funcionalidades, as mais utilizadas são a Carteira de Trabalho Digital, o ECAC (Centro Virtual de Atendimento da Receita Federal) e o Meu INSS.

Apesar disso, ainda há desigualdade no acesso à informação e, consequentemente, no aproveitamento dos recursos de cidadania digital.

Uma pesquisa publicada em 2024pelo Cetic.br (Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação) mostrou que o número de usuários da internet que realizaram algum serviço público online nos últimos três meses varia de 12% a 60%.

Essa oscilação se dá pela diferença na qualidade do acesso à internet entre os brasileiros.

Níveis de conectividade influenciam no acesso a serviços públicos

Os níveis de conectividade utilizados na pesquisa da Cetic “Conectividade significativa no Brasil: o retrato da população”, conduzida pela socióloga Graziela Castello, são calculados com base em critérios para avaliar a infraestrutura de internet do domicílio.

Comparação de atividades feitas na internet e qualidade de conectividade

Comparação de atividades feitas na internet e qualidade de conectividade – Foto: NIC.BR, 2024

Quanto menor o nível de conectividade, mais precário o acesso à internet. Entre os quesitos avaliados, estão:

  • custo da conexão à internet inferior a 2% da renda familiar;
  • mais de um dispositivo com acesso à internet por pessoa;
  • presença de computador; conexão por fibra ótica ou cabo;
  • velocidade da internet satisfatória; frequência de uso da internet;
  • utilização da internet em outros locais, como escola ou trabalho.

Entre esses indicadores, o mais presente na população brasileira é a frequência diária de uso da internet:82% dos cidadãos que estão conectados acessam a web todos os dias.

Já o menos comum é o custo da conexão ser inferior a 2% da renda domiciliar, algo que apenas 20% dos brasileiros alcançam. Entre as pessoas com menor nível de conectividade, 12%utilizaram serviços governamentais on-line nos últimos três meses.

À medida que o acesso à internet cresce, também aumenta a proporção de pessoas que utilizam o serviço.

No entanto, entre as ações classificadas pela pesquisa como atividades transacionais – que também incluem estudos, trabalho, atividades financeiras e compras –, os serviços públicos são os menos utilizados.

“Se formos ver a diferença de pontos percentuais, pessoas com alto nível de conectividade acessam o governo on-line quatro vezes mais. E, ainda assim, tem mais gente fazendo compras pela internet que acessando sites do governo. Ainda há estudos sendo desenvolvidos para entender os motivos disso, mas pode ser que os sites de compras estejam mais intuitivos que os do governo, ou simplesmente uma questão de prioridades dos usuários”, explica Graziela.

Inclusão digital não depende apenas do acesso à internet

A pesquisadora reforça que a inclusão digital não depende apenas do acesso à internet, mas também de boa infraestrutura e de quais serviços são acessíveis.

“Mesmo que 84% da população brasileira acesse a internet, apenas22% têm condições adequadas, e isso impacta diretamente nas atividades que eles realizam.”

O estudo conclui que, quanto maior a conectividade, maior a probabilidade de serem desenvolvidas atividades produtivas, que impactam positivamente na autonomia e cidadania, como estudos e emprego.

“Justamente aqueles que mais poderiam se beneficiar dessas possibilidades são os que estão mais distantes das condições mínimas necessárias para seu aproveitamento”, afirma a pesquisadora.

Graziela também revela as observações deum novo estudo sobre conectividade e serviços de governo on-line em desenvolvimento:

“Encontramos uma forte associação entre pessoas que dizem que preferem os serviços presenciais e pessoas com baixo nível de conectividade. Então talvez não seja uma preferência pelo presencial, mas uma dificuldade em usar os serviços on-line.”

Estado e município oferecem serviços on-line locais

Santa Catarina é um dos estados com menor faixa de população no nível mais baixo de conectividade –26% dos catarinenses estão na faixa de 0 a 2 pontos de conectividade, enquanto a média nacional é de 33,1%.

Já a taxa de pessoas com a melhor conexão é de 25%,maior que o valor nacional, que corresponde a 22%.

Heitor Blum S. Thiago, diretor executivo do CPDI(Comitê para Democratização da Informática),organização da sociedade civil que promove inclusão social e cidadania através da tecnologia de informação, explica que Santa Catarina tem um grande diferencial na área.

“Na década de 1990, o estado criou a RCT (Rede Catarinense de Ciência e Tecnologia), a primeira rede de internet doestado, para disponibilizar internet a instituições de ciência, tecnologia e inovação.”

Graças à RCT, a UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina)foi a primeira universidade brasileira a conceder contas de e-mail para todos os alunos, em 1996. Além dos serviços on-line federais, também existem utilidades locais oferecidas à população pelo estado e pelo município.

O portal dos serviços on-line estaduais, sc.gov.br, é vinculado ao portal federal e oferece até 470 utilidades, como o cadastro no programa Universidade Gratuita, o registro de boletim de ocorrência on-line, o cadastro para recebimento de alertas da Defesa Civil em caso de desastres e obter e renovar a CNH (Carteira Nacional de Habilitação) digital.

As denúncia se reclamações enviadas ao Procon – SC por meio do portal somam mais de 160 mil solicitações. Florianópolis, conhecida por ser polo de tecnologia e inovação, também atende aos cidadãos por meios digitais.

Entre os sites e aplicativos mais utilizados estão o aplicativo Floripa no Ponto, que permite acompanhar itinerários de ônibus e fazer a recargado cartão on-line, e o Alô Saúde, que promove atendimento pré-clínico por telefone, vídeo chamada ou chat 24 horas por dia e já foi usado por mais de 87 mil pessoas.

Além disso, pelo site da prefeitura também é possível acessar o Cadastro Habitacional, o Aprova Digital e o Procon on-line.

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