

Campus Trindade, o principal da UFSC, leva o nome de João David Ferreira Lima, ex-reitor acusado de colaborar com a ditadura militar – Foto: Reprodução/ND
O imbróglio envolvendo a mudança do nome do campus da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), em Florianópolis, teve mais um capítulo, após reunião do Conselho Universitário nesta sexta-feira (6).
Durante a sessão, foi analisado o pedido de impugnação do processo que revoga a homenagem ao ex-reitor João David Ferreira Lima e também o relatório com recomendações da CMV (Comissão Memória e Verdade).
O debate acerca da homenagem começou em abril, quando foi realizada a primeira sessão para tratar da sugestão feita pelo relatório da CMV e a petição de impugnação apresentada em janeiro de 2023 pela advogada Heloísa Blasi Rodrigues, representando Davi Ferreira Lima, filho do ex-reitor.
Conselho Universitário rejeita impugnação
O pedido de impugnação ao relatório final da CMV foi apresentado pela defesa da família do ex-reitor, João David Ferreira Lima. A petição alega que o relatório atribuiu “fatos e juízos de valor lesivos à honra e à memória do ex-reitor”, sem observar os princípios constitucionais do contraditório. A relatoria da matéria foi do conselheiro Ubirajara Franco Moreno.
O conselheiro entendeu o pedido como “legítimo exercício do direito de petição, garantido pela Constituição Federal“. Contudo, Moreno afirmou que o relatório final da Comissão possui “natureza eminentemente histórica e memorialística, voltada à reconstrução da memória institucional e à promoção do direito à verdade histórica”, e que o documento “não gera efeitos jurídicos concretos que possam ser anulados ou reformados mediante impugnação administrativa”.

Busto de Ferreira Lima, no campus da UFSC, foi inaugurado em 1995; ele foi o primeiro reitor da universidade federal – Foto: Salvador Gomes/UFSC/Divulgação/ND
O parecer acolheu duas demandas apresentadas na petição. A primeira é a recomendação para que a obra “UFSC: Em Nome da Verdade”, de autoria de Heloísa Blasi Rodrigues, seja disponibilizada no Instituto Memória e Direitos Humanos e na Biblioteca Universitária. A segunda é a limitação do escopo de atuação da CMV ao período estabelecido pela Lei nº 12.528/2011 — de 18 de setembro de 1946 a 5 de outubro de 1988.
O parecer do relator também acolheu a recomendação para a elaboração de uma resolução específica que regulamente a preservação da memória institucional e a proteção da comunidade universitária contra violações de direitos humanos. O pedido de impugnação, em sua maioria, foi rejeitado.
Mudança no nome do campus da UFSC ficará para próxima semana
A revogação da homenagem ao ex-reitor foi tratada em um parecer conjunto, elaborado pelos conselheiros Alex Degan e Amanda Zamboni, na condição de relatores de vista. A mudança no nome do campus da UFSC também foi abordada no parecer do conselheiro Ubirajara Franco Moreno.
Os conselheiros Alex e Amanda concordaram com as Recomendações 1, 2, 3, 4, 7, 10, 11 e 12 do relatório da CMV, que incluem ações como a ampliação dos acervos históricos da UFSC, a criação de um programa de extensão sobre memória e direitos humanos, e a recuperação do edifício do Centro de Convivência, sede do DCE (Diretório Central dos Estudantes).

João David Ferreira Lima, fundador e primeiro reitor da Universidade Federal de Santa – Foto: Acervo/UFSC/ND
A recomendação número 8, que propõe a reabertura de casos revelados pelo relatório, foi desconsiderada pelos conselheiros, ao reconhecerem as limitações jurídicas apontadas no parecer original. Quanto à orientação número 6, que trata da reavaliação de homenagens, os conselheiros sugeriram uma sessão especial do CUn (Conselho Universitário) para tratar do tema.
Foi estabelecida a data de 13 de junho, próxima sexta-feira, para o debate sobre a mudança no nome do campus da UFSC. O prazo busca respeitar o artigo 17º do Estatuto da UFSC, que exige “a aprovação por três quintos do total de seus membros”. Os conselheiros enfatizaram que a deliberação deve ser por voto aberto, como na concessão do nome atual. Na segunda votação, o parecer foi aprovado por maioria, com apenas dois votos contrário
Entenda discussão sobre homenagem a ex-reitor
A Comissão Memória e Verdade da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina) recomendou que a universidade tome medidas para reparar os danos causados pela Ditadura Militar, ocorrida no Brasil de 1964 a 1985.
Entre os pedidos, o relatório sugere que sejam retiradas as homenagens ao ex-reitor João David Ferreira Lima, que teria perseguido estudantes, professores e servidores no período.
Uma pesquisa aponta, no entanto, que a história do ex-reitor João David Ferreira Lima não era exatamente como descrito no relatório da Comissão. O livro “UFSC: em nome da verdade”, escrito pela advogada Heloisa Ferro Blasi Rodrigues e lançado em dezembro de 2024, mostra supostos equívocos no relatório.
Contraponto
Em nota enviada ao ND Mais, a advogada Heloísa Ferro Blasi afirmou que na sessão desta sexta-feira, “após mais de dois anos, enfim, por conta de uma decisão liminar concedida pela Justiça Federal, o reitor foi obrigado a pautar o processo de impugnação ao relatório da comissão da memória e verdade para deliberação no Conselho Universitário”.

Reunião do CUn termina sem uma decisão sobre a mudança no nome do campus da UFSC – Foto: Stefani Ceolla/ND
A defensora, contudo, criticou o tempo cedido para argumentação, de apenas cinco minutos. “Não me foi possível apresentar as razões e provas que havia preparado, em total prejuízo da defesa em processo tão difícil e complexo”, destacou.
Blasi solicitou que o ato fosse lavrado em ata e, segundo ela, “um dos conselheiros — Alex Degan —, fez uma dancinha desrespeitosa. Foi aplaudido e assistido como graça pelo reitor e vice-reitora, que participavam da mesa”. Para Heloísa, é “uma lástima ver no que a UFSC, pelo seu órgão máximo, se tornou”.
A reportagem do ND Mais contatou a UFSC para entender o que motivou o gesto do docente, mas não obteve retorno até o fechamento desta matéria. O espaço segue aberto para manifestação.