Como é a jornada do mel de melato da Bracatinga em Santa Catarina

mel de melato

A jornada única do mel de melato da Bracatinga: da colmeia para o pote, um processo cheio de aprendizados e recompensas – Foto: Divulgação

Um produto que vale ouro para os catarinenses: o mel que vem das flores, com alta concentração de antioxidantes e minerais, além de ser mais saudável e menos doce – um produto que não existe em outro lugar do mundo: o mel de melato da bracatinga.

Na Serra Catarinense, território denominado Planalto Sul Brasileiro que está a bracatinga, árvore nativa da Mata Atlântica, presente em florestas de araucárias e de clima subtropical úmido. Em meio ao verde, é o tronco negro que se destaca. É somente nessa região, em áreas com altitude acima de 700 metros, que ocorre o início da nova safra do mel de melato da bracatinga – conhecido como o ouro negro da Serra Catarinense, e eleito em 2017 como o melhor mel do mundo.

Trata-se de um momento raro, pois somente a cada dois anos as bracatingas são infestadas por cochonilhas que sugam sua seiva. O fio branco é o canal excretor por onde o inseto elimina um líquido açucarado que atrai as abelhas que, por sua vez, estão em busca de alimento durante o período de baixa florada.

Saulo Poffo, engenheiro agrônomo da Epagri, explica que isso ocorre a cada dois anos porque é o ciclo de vida da cochonilha, que parasita a bracatinga. No primeiro ano a cochonilha está menor e produz pouco melato, já no segundo ano, produz em maior quantidade e as abelhas conseguem aproveitar a época para produzir o mel de melato, desde que exista uma grande quantidade de bracatingas e o apiar esteja próximo.

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Descubra como o processo de produção deste mel raro proporciona oportunidades e benefícios para produtores e consumidores – Foto: Divulgação

Saulo estuda e acompanha as abelhas de perto há pelo menos quatro décadas e apesar da experiência com as abelhas, sabe que há muito a ser pesquisado sobre a produção do mel tão diferenciado.

“- Tem árvores que são bem infestadas de cochonilha, tem algumas que não têm nada e outras totalmente escuras, com bastante filamento. Ainda demanda muita pesquisa para poder plantar bracatingas e para saber se, de repente, dá pra ajudar a natureza a colonizar essas árvores novas com a cochonilha” – explica.

Todo esse interesse é recente e representa um novo momento de reconhecimento de um produto único e exclusivamente nosso. Saulo também conta que no início dos anos 2000 enviaram uma amostra de mela para a Alemanha e os alemães acharam o mel de melato da bracatinga muito parecido com o mel escuro da floresta negra da Europa. Eles gostaram e quiseram comprar o produto brasileiro, que elevou o preço, valendo mais do que o mel floral.

A valorização do produto animou muitos apicultores que demandaram mais estudos e investimentos em tecnologias por parte dos órgãos de pesquisa. Quando não está em campo, Saulo está no escritório buscando novas técnicas de manejo e proteção de pragas.

Mel de melato da bracatinga e suas oportunidades

Acompanhar a retirada do mel tem seus riscos, mas também proporciona aprendizados únicos e traz recompensas. É um processo que exige tranquilidade, respeito com a natureza e boas práticas sanitárias. Começa na colméia e só termina depois que todas as etapas no entreposto são cumpridas. É de encher a caixa, os olhos e a centrífuga – sim, neste caso a retirada do mel tem o mesmo princípio da máquina de lava-roupas. É só colocar para girar e aos poucos o mel vai caindo no fundo, passa pela peneira, pelo galão de decantação até ganhar o pote, rótulo e selo.

Selo arte ou de indicação geográfica por denominação de origem, um papel pequeno com muito trabalho envolvido e que enche de orgulho muitos produtores e associações da região. Mas para chegar até aqui foi preciso percorrer uma longa trajetória.

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Reconhecido como o ‘ouro negro’, tornou-se um produto de destaque na gastronomia e na saúde – Foto: Divulgação

Há quem prefira no pão, no chá e há quem utilize na fabricação da bebida alcoólica mais antiga do mundo. A especialidade de uma casa em Lajes é a cerveja, mas o hidromel chegou em julho do ano passado e já conquistou admiradores. Nos tanques de fermentação, apenas água, mel de melato da bracatinga e levedura.

Já, em um bar da cidade, o mel de melato faz dupla com a cachaça. Anos atrás o proprietário começou a servir para os clientes uma dose com uma colherinha de mel e hoje virou sucesso com público.

O mel de melato da bracatinga cada vez mais chama atenção do cliente e do turista, se vende sozinho pelo nome graças ao empenho da pesquisa que comprovou as características e benefícios deste produto que é único no mundo.

Da colmeia para a cidade: aos poucos, o mel escuro que no passado foi rejeitado por muitos produtores e consumidores, começa a ser disputado. Sim, ele já é requisitado em mercados, feiras, bares e restaurantes.

Na rota gastronômica de São Joaquim, o produto ganha destaque nos pratos e no cardápio. O mel de melato por si só já é saboroso, mas ainda tem como inventar pratos e aproveitá-lo melhor. Vai bem na salada, como molho reduzido em cima da panceta de porco, e na sobremesa cai como uma luva. E se na serra ele já é tão bem aproveitado e respeitado é porque no campo e na Capital o trabalho tem sido constante.

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Uma delícia da natureza da Serra Catarinense – Foto: Divulgação

Ana Carolina Costa, Coordenadora da Comissão de Qualidade do mel de Bracatinga, é um dos elos dessa corrente. É responsável pelo laboratório de química de alimentos onde são analisadas as características físico-químicas e bioativas dos méis catarinenses.

“- Quando nos deparamos com o mel de melato as perguntas eram: por que ele é tão escuro? Por que ele tem um sabor mais ácido em relação aos méis florais? Por que ele não cristaliza? Quais são as características que fazem com que ele seja um produto tão apreciado para que praticamente 99% fosse exportado para Europa?”- conta a especialista.

Aos poucos as perguntas foram sendo respondidas e quanto mais produziam informação sobre o mel de melato mais era nítida a diferença entre ele e os demais. Segundo Ana, ele possui uma atividade antioxidante mais elevada quando comparados aos méis florais.

Além disso, o mel de melato da Bracatinga tem atividade antiinflamatória, com muitos minerais, como sódio, potássio, magnésio e manganês – minerais que são importantes também para o funcionamento do nosso organismo. Ele também tem uma acidez maior que torna seu sabor diferenciado.

As características do mel de melato chamaram tanta atenção na época, que se levantou a possibilidade da certificação, de um selo de identificação geográfica. E foi aí que começou uma verdadeira força tarefa dentro da Universidade Federal de Santa Catarina. Foram mais de 1500 análises para comprovar as características que o tornam único.

Então foi um trabalho conjunto entre FAASC, Epagri, Universidade Federal de Santa Catarina e Sebrae. O resultado foi a conquista do selo de indicação geográfica concedida em 2021 pelo IMP.

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Da colmeia à mesa: o mel de melato da Bracatinga encanta com sua história e sabor – Foto: Divulgação

A denominação de origem é uma modalidade da indicação geográfica que pressupõe que há uma determinação do território sobre a qualidade do produto; 134 municípios fazem parte do território – 104 de Santa Catarina, outros 12 do Paraná e 15 do Rio Grande do Sul – uma outra característica é a presença da Bracatinga.

A ocorrência na natural da Bracatinga que ocorre junto às matas de araucária e junto ao clima quente e úmido, outros critérios também foram incluídos, como a altitude acima dos 700 metros e o uso e cobertura da terra.

A Federação que representa o apicultor foi a instituição solicitante do IG e hoje é a porta de entrada para quem sonha com o futuro, que promete ser cada vez mais promissor. A indicação geográfica teve a primeira safra em 2022 e está entrando na segunda safra em 2024 – hoje são nove empresas credenciadas dentro do projeto, representando cerca de 40 apicultores.

Esse tipo de identificação ajuda a beneficiar os produtos de pequenos e médios produtores com o objetivo de agregar valor aos produtos e protegê-los. Algumas empresas, inclusive, já aumentaram as vendas em 30% no mercado nacional.

Se você ficou interessado e quer saber mais sobre a jornada do mel de melato da Bracatinga em Santa Catarina, aproveite e assista ao episódio especial do programa Agro, Saúde e Cooperação – um projeto desenvolvido pelo Grupo ND, em parceria com a Ocesc, Aurora, SindArroz Santa Catarina e Sicoob.

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