Criatividade: peixe de aquário ou mergulho no oceano da IA?

Parece até debate eleitoral, atividade que ambos conhecemos bem: o André escreveu, eu rebati, ele contra-argumentou e agora, como manda o manual da boa discussão, chegou a hora da tréplica. Embora haja nessa discussão toda muito mais concordância do que tretas.

A criatividade estaria em crise? Ou seria a discussão sobre ela? Meu amigo publicitário André Balaban, que entende tanto de criação quanto de boas provocações, lançou um debate interessante em artigo aqui no site do Upiara: afinal, a criatividade ainda é uma exclusividade humana?

Eu não resisti e entrei na conversa para dar uma leve provocada: será que a IA já pode ser considerada criativa? Em seu último texto, o André foi preciso ao diferenciar criatividade técnica, que a IA até desenvolve, de criatividade emocional, essa sim profundamente humana.

A grande questão aqui não é se a criatividade da IA é igual à humana. Isso é ponto pacífico, pois é claro que não é. A questão a ser debatida é se ela não tem nenhum tipo de criatividade. É incômodo admitir que uma máquina possa ter lampejos criativos.

E, claro, para manter o nível do debate com o erudito André, eu também trouxe algumas citações de peso. Afinal, criar argumentos bem fundamentados também faz parte da diversão!

O psicólogo Mihaly Csikszentmihalyi, autor do conceito de “flow” (olá Murilo Gun!), argumenta que a criatividade não é apenas um ato individual, mas também depende do reconhecimento social.

Em outras palavras, algo é criativo se for aceito como tal por um grupo. E se a IA cria um texto ou uma música que nos impacta e nos faz refletir, por que não considerar isso uma expressão criativa?

Tem mais: Howard Gardner, no livro “Estruturas da Mente”, define criatividade como a capacidade de resolver problemas de maneira inovadora ou criar produtos que influenciem um campo de atuação.

Dentro dessa lógica, quando um algoritmo cria um arranjo musical inédito ou desenvolve um texto persuasivo, ele está sim cumprindo um papel criativo. A diferença para os humanos é que a IA não possui intenção consciente.

Ou seja, é claro que a IA não sente emoção, não cria por desejo e nem tem senso estético. Mas ela recombina ideias, e gera algo novo com base nos padrões que aprendeu. É uma criatividade técnica, sem alma, mas ainda assim uma forma de criar.

Quando um algoritmo gera um poema inspirado no meu conterrâneo Carlos Drummond de Andrade, ele não sente, mas reorganiza versos com lógica poética. Isso é imitação? Sim. Mas a imitação também é uma forma de criação.

O André tem razão quando diz que a IA não tem criatividade emocional. Mas talvez a pergunta de fundo seja essa: podemos chamar de criatividade apenas aquilo que tem emoção ou podemos abrir um pouco a mente para reconhecer que a recombinação inteligente também é criação?

Se criatividade for só expressão de sentimentos, está resolvido: a IA não é criativa. Mas se entendermos que criar também pode ser encontrar soluções inéditas e inventar possibilidades, então talvez a IA esteja sim se intrometendo no nosso território.

No fim das contas, talvez o maior erro seja achar que só existe um jeito de pensar a criatividade. Como peixes no aquário, podemos estar tão presos à nossa própria definição. Não conseguimos ver o oceano de possibilidades que a inteligência artificial traz.

Talvez estejamos diante de uma expansão do conceito, e isso não significa perda ou substituição, mas sim evolução. Afinal, o oceano da criatividade pode ser maior do que imaginamos — e aceitar que a IA possa contribuir não significa abrir mão da nossa capacidade de criar.

Esta é a tréplica. Não para encerrar o debate, mas para expandir a visão sobre criatividade. Porque às vezes o oceano é maior do que imaginamos.

E falando em criatividade e comunicação, aproveito para convidar o André e todos os leitores para o Politicall – O Show da Comunicação, em Florianópolis. Vamos debater, entre outras coisas, a criatividade dos políticos e gestores — com ou sem IA.

Afinal, quem disse que só quem sente pode transformar o mundo? Talvez reinventar seja também permitir novas formas de criação.

ps: a IA é tão boa que nos deixa até mais bonitos rs.

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